Recursos Financeiros Ajudam Mas Não Resolvem Tudo

Criada em 04/02/2011 03:30 por maperna | Marcadores: art fen

Josué Setta 

É natural que municípios ou regiões mais carentes ou  que estejam passando por dificuldades eventuais, necessitem de ajuda  governamental na forma de investimentos diretos, empréstimos, renegociação de dívidas ou outras formas de transferência de recursos. A injeção de recursos financeiros, direta ou indiretamente feita pelos governos é, com certeza, uma contribuição importante, nesses casos. Mas, na verdade, se constitui, apenas, em um dos ingredientes necessários a reabilitação local. Por si só, não garante o reerguer de uma região ou a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, com sustentação ao longo do tempo.  

A garantia que esses recursos possam gerar resultados efetivos e duradouros está nas possibilidades concretas dos investimentos encontrarem situação favorável para alcançarem a máxima efetividade, vencendo a inércia que acomete esses locais e produzindo uma nova dinâmica de vida que se traduza em benefícios permanentes para a população. 

A criação ou o estimulo a um vetor econômico potencial, capaz de fazer florescer uma economia local e regional é ingrediente indispensável, na medida em que gera emprego,  renda, impostos, resgata a dignidade dos cidadãos. Nesse sentido, a identificação das vocações, das potencialidades existentes nesses espaços territoriais, pode definir o vetor com maiores chances de prosperar, considerando-se, logicamente, outras variáveis complementares que são importantes nos estudos de viabilidade dos negócios. 

Outro aspecto essencial, diz respeito a um mínimo de capacidade de gestão, onde sejam estabelecidos propósitos, prioridades, racionalidade de gastos, coerência entre projetos e tudo mais referente a um fazer consciente e em ritmo apropriado.  

A qualificação da mão de obra local e a possibilidade de se ter acesso a serviços de profissionais bem preparados, mesmo que temporariamente, a assistência técnica, fazem toda a diferença. É muito mais comum do que se imagina, que prefeituras não consigam nem mesmo desenvolver os projetos que necessitam para encaminhamento de seus pleitos. Vale lembrar que, embora os avanços da modernidade sejam sempre desejáveis, não é preciso a implantação de “grandes negócios” para que “a salvação aconteça”. 

Uma questão essencial e frágil em nossos hábitos e tradições, diz respeito a necessidade de se fazer  despertar o chamado “capital social”, existente  muitas vezes apenas em estado embrionário, latente ou adormecido na sociedade, mas que pode se tornar um diferencial importante e  o oxigênio capaz de manter acesa a chama de um braseiro de iniciativas que, com certeza, vai esquentar aos poucos, por vezes ameaçar apagar, arder em fogo brando até que se firme como chama e aqueça um processo de progresso local ou regional. 

O capital social, assunto que atrai estudiosos e pesquisadores, é a capacidade de mobilização da sociedade em favor de causas coletivas. É a não resignação, a compreensão do papel de cada um e de todos, é não esperar que o Estado dê de “mão beijada” aquilo que a própria sociedade pode fazer ou, pelo menos, ajudar a construir. É cobrar o que lhe é de direito e não esperar por migalhas. Enfim, é um padrão de organização capaz de fazer agir em prol do interesse coletivo. É a capacidade de cooperar socialmente. 

As grandes tragédias, como as recentes no Rio de Janeiro, motivam a solidariedade, mas não necessariamente mobilizam o capital social. Solidariedade e capital social são manifestações  diferentes do comportamento humano. Talvez a solidariedade colabore, nesses momentos em que todos estão sensíveis diante da constatação da fragilidade humana, no despertar de lideranças que ajudem a potencializar o capital social a partir do resgate da relação de amor,  costumeiramente existente entre o cidadão a terra em que vive. Aquele orgulho do “ser da terra”, a agradável sensação de se sentir pertencendo a um lugar. As cidades não existem apenas por possuírem ruas, praças, casas e edifícios mas, também, por possuírem outros atributos que, embora intangíveis, lhes dão vida e identidade, como sua história, suas famílias tradicionais, beleza, a culinária, o folclore e toda uma “energia” proveniente do dia à dia, do ir e vir das pessoas, dos encontros fortuitos ou não daqueles que nelas convivem. A dor da tragédia pode acordar esse espírito de união no desejo de fazer renascer aquilo que, de alguma forma, é parte de cada um. 

Varias entidades representativas da sociedade civil organizada podem atuar na mobilização dessa força da sociedade. Federações, entidades patronais, sindicais, ONGs, associações de todo tipo. Todos sairão ganhando na medida em que construam um ambiente onde os investimentos, não só financeiros, certamente terão ampliadas as chances de um retorno vantajoso. 

O segredo da criação de um ambiente favorável a que os recursos financeiros alcancem seu máximo aproveitamento está, portanto, na integração de vários fatores - identificação de vetores econômicos, capacidade de gestão, pessoal qualificado, assistência técnica -,  entre outros, todos potencializados pelo envolvimento da sociedade numa causa que, acima de tudo, lhe pertence. 

E não há que se esperar nenhum governo para fazer isso. É preciso que a própria sociedade tome suas iniciativas e esteja pronta para interagir com as instancias políticas construindo, com clareza, aquilo que realmente a população deseja. 
 

Josué Setta

Engenheiro, Professor da UERJ, DSc 

Artigo publicado no Jornal Monitor Mercantil em 2/02/2001

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