Um Amigo

Criada em 06/08/2010 23:34 por maperna | Marcadores: fen geral


Um amigo

Há poucos dias atrás, fui surpreendida por uma pergunta vinda de um desconhecido.

- Quem era esta pessoa? Era alguém importante?

Atordoada pelo turbilhão de acontecimentos vividos nos últimos dias, aliás, os dias mais tristes de minha vida; sem dar muita importância ao indagador, simplesmente respondi:

- Era o meu marido.

Segui meu luto em silêncio, mas  aquela pergunta permaneceu em meus pensamentos.

O que despertou a curiosidade daquele desconhecido sobre “quem seria aquela pessoa”?

Afinal, travava-se tão somente de mais um momento de despedida de um ente querido, entre tantos outros presenciados diariamente pelos trabalhadores daquele local.


O que quis dizer com “alguém importante”?


Acredito que todos que ali estavam sendo homenageados, de alguma maneira, eram importantes para alguém.

Posteriormente, conclui que a curiosidade sobre “quem seria aquela pessoa” surgiu em função da grande multidão que ali se concentrava.

Quantas pessoas? Duzentas? Trezentas? Não sei. Só sei que eram muitas...

De fato, era admirável. Acho que até mesmo ele estaria surpreso com o quão é

Uma coisa é possuir uma agenda telefônica cheia. Outra é pensar que se fizéssemos uma “chamada” desses nomes, quase todos, estariam lá para responder: “presente”.

E como alguém se faz tão querido no decorrer de sua vida?

Por enquanto, ainda não somos criaturas perfeitas, portanto, não existe ninguém sem defeitos ou sem qualidades.

O que pode ser considerado positivo aos olhos de uns, para outros poderá ser negativo.

No caso de nosso querido Maurício, ele era sua própria antítese:

Decidido e determinado ao mesmo tempo em que era cauteloso;

Forte e firme, ao mesmo tempo em que era sensível e pasmem, até mesmo delicado;

Simples e vaidoso. Orgulhava-se do que era e não do que possuía. Quando obtinha êxito em suas demandas, frequentemente afirmava com o ego inflado: “o Mauricinho é fo... Fo... Fogo”;

Agitado e inquieto, mas capaz de transmitir aos que o cercavam proteção e segurança.

Em seu estilo ímpar, simplesmente, este era o jeito Maurição ou Maurício Rey de ser.

Quem foi esta pessoa?


Carioca. Filho de classe média e primogênito entre três irmãos, Pretendia seguir a carreira de advogado, mas desistiu daquela pô... Pô...

Frequentemente afirmava que seu raciocínio lógico só entendia 2+2 = 4. Nada de perder tempo filosofando...

Em 1953 prestou novo vestibular para a escola nacional de engenharia, concluindo o curso em 1957.

Ah! A engenharia! Dentre todos os amores de sua vida, esta sim, foi sua maior  paixão: sedimentar, edificar, realizar projetos, e finalmente, vê-los sob sua forma concreta. Agora sim, ficou campeão! Logo depois, iniciar um novo trabalho e assim sucessivamente... Parecia não querer parar nunca. Quanta energia! Quanta
vitalidade!

Até mesmo quando viajávamos a paisagem natural não o impressionava tanto quando as edificações locais.

- Meu querido olha que rio imponente! Lindo
- É anjo! Mas essa ponte que está sobre ele é que é do ca... Ca... Caramba!
Logo, logo voltava sua atenção para algo que achava mais admirável que o próprio rio, mas a generosa natureza o compreendia.

Para ele, tão ou mais importante que seu ofício de engenheiro, era o de ser professor: professor de engenharia é claro.

Ainda aos 23 anos abraçou o magistério, carreira esta que, por natural vocação, exerceu durante toda sua vida.

Mesmo já estando compulsoriamente aposentado, sempre que solicitado, não perdia o que considerava de “mais uma chance de dar uma aulinha”. E que aulinha. Literalmente, suava a camisa. Parecia ter vestido seu jaleco cor “azul engenharia” ainda molhado.
Andava agitado de um lado para o outro, gesticulava, falava alto com seu tom de voz grave e gargalhava mais alto ainda. Verdadeiro êxtase; que felicidade! E que ninguém ousasse interrompê-lo naquele momento por qualquer outra coisa que fosse.
Tinha a consciência do respeito devido àqueles que saíram de suas casas, fazendo os mais diversos sacrifícios para estarem ali o assistindo.

Um fato interessante ocorreu um dia em que seu fiel escudeiro, há quase trinta anos, carinhosamente por ele apelidado de “baixinho”, foi até a sala em que ministrava aulas levar-lhe algo para beber. Demorou um pouco para retornar. De volta, justificou-se dizendo que ficou esperando uma pausa. Durante a espera  observou-o e ficou muito preocupado com o “doutor”. Disse-me:

“... Mariazinha acho que o doutor está com algum problema de cabeça. Não tá falando coisa com coisa. Estava nervoso, vermelho, falando de um tal de “momento”. Será que o “momento” dele é diferente do nosso?"

Confesso que também não entendi, mas fiquei curiosa. Quando Maurício terminou a aula e retornou ao departamento, relatei o fato e perguntei o que havia acontecido. Ele arregalou seus olhinhos verdes, gargalhou e disse:

“...o que? Acredita em mim? É claro que está tudo bem. Eu só estava explicando o “momento fletor.”

Não lhe importava se a turma fosse composta por vinte ou somente por dois alunos. Sua disposição era sempre a mesma. Dedicava-se a elaborar e corrigir provas e trabalhos; ainda quase de madrugada. Dizia que naquela hora da manhã tinha mais te... Te... Tempo para fazê-lo.

Entristecia-se quando o desempenho daqueles mé... Mé... Meninos não era satisfatório. Lamentava-se dizendo “eu não consegui ensiná-los”.

Nunca eu o ouvi dizer “eles não aprenderam”.

Era impressionante a necessidade que sentia de estar entre os jovens aos quais carinhosamente chamava de “meninos’; alguns já nem tão jovens e nem tão “meninos” assim.

Era este convívio diário que o revigorava.
Apesar da cor branca de seus cabelos (aloirados, era assim que por vaidade se autodenominava) sua alma também era de “menino”.

Precisava desfrutar da companhia de jovens, pelo menos dos jovens de espírito.

Sorvia esta energia como se fosse ar.

“era alguém importante” ?


Que tal uma personalidade pública? Um artista? Um esportista? Ou um escritor?
Não. Não. Nada disso.

A “personalidade pública”
era só um cara muito popular. Ele era “o cara”.

“artista” - só na arte de viver: uma figura. E que figuraça!

“esportista” já foi competidor de moto-náutica, mas atualmente, só guardava boas recordações deste feliz período de sua vida.

Nos últimos tempos, o jogo que mais praticava era “lixo ao cesto” tarefas das quais fazia questão em colaborar na rotina doméstica).

“escritor” só de despachos curtos e diretos. Também é claro, de carinhosos bilhetinhos, os quais guardarei para sempre.

Na realidade, a resposta que eu não soube dar naquele momento era bem simples:

“aquela pessoa” além de ser um homem grande, também era um grande homem”

Homem grande não. Melhor dizendo; amplo e espaçoso. Caso contrário, em que outro peito poderia bater aquele enorme e generoso coração: coração de amigo

Marido amigo - companheiro e cumplice incondicional.

Pai amigo – desde os primeiros passos de seus filhos, vibrava com suas conquistas alcançadas ao longo do caminho percorrido, considerando-as como sua própria vitória.

O sucesso de ambos, em suas vidas pessoal e profissional, sempre foi para ele, motivo de grande orgulho. Ah! Estes sim. Os herdeiros das qualidades do “papai”;

Avô amigo – legítimo “pai com açúcar” para com seus netos tão amados.

Irmão amigo – tinha para si o papel de protetor dos “caçulinhas” – deixa comigo que eu resolvo!

Sogro amigo – em defesa da causa justa, aliava-se à seus filhos “postiços”, ainda que contrário aos seus próprios rebentos.

O mestre amigo – mais do que professor; não se limitava simplesmente ao ensino do exercício da profissão. Também considerava ser seu dever prepará-los e auxiliá-los para o exercício da vida real.

Amigo dos amigos - leal e fiel com todos aqueles que conseguissem cativar sua amizade.

Sem mencionar os amigos com os quais dividiu boa parte de sua vida e já o consideravam como um verdadeiro ou segundo “pai”.

Quando ainda em vida, ele sempre soube o quanto eu o amava. Mesmo que não o dissesse a todo momento, ele podia percebe-lo em meus atos. Só lamento nunca tê-lo dito abertamente o quanto eu o admirava e o quanto me
sentia vaidosa por ter sido escolhida como sua esposa e orgulhosa por ter um companheiro de seu quilate.

ah! Meu querido fofíssimo! Quantos órfãos você deixou!

Cara Maria Eugênia,

No meio de tanta emoção e tristeza, gostaria de manifestar minha enorme alegria em ver que meu pai colaborou tanto para o bem da UERJ e de todos que o cercaram no seu dia a dia na Universidade. Tudo que foi dito tinha a "cara" do meu pai.
Realmente ele foi um apaixonado em tudo que fez, inclusive na missão de educar seus filhos. Saibam que ele foi um pai maravilhoso, um verdadeiro amigo. A propósito, nunca levantou a mão pros seus filhos. Sempre nos educou com o papo franco e honesto.
Esse foi um pequeno relato do pai Maurição, meu "brother" (era assim q eu o chamava) e amigo dos meus amigos!
Sinta-se a vontade de compartilhar este e-mail com as pessoas da relação de meu pai na UERJ.
Agradeço, em meu nome e da minha família, todo o carinho e suporte que o time da UERJ nos deu.

Super beijo pra vcs.


JM


Fonte: DIRFEN

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Maurício José Ferrari Rey,

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Em 09/08/10 08:05 ANDERSON MIGUEL CANEDO disse:

Dispensa comentários; quem o conheceu sabe disso. Sua contribuição foi além das salas de aula.

Em 08/08/10 23:46 ROBERTO L. WAICHENBERG disse:

Mauricio meu grande amigo, O tempo passa, os fatos se tornam relatos, as noticias se tornam arquivos de memória, mas você com a sua personalidade, a sua maneira no trato com os amigos, a sua confiança irrestrita nos mais chegados e nunca discutidas ou questionadas, são fatos que cuja lembrança nunca, não importa o tempo físico, o afastará da minha memória. Ter tido você como um amigo foi um prêmio muito valioso. Até um dia amigo pois nestes comentários que lí a seu respeito, só vêm acrescentar a minha admiração e respeito ao amigo tão querido.