Retrocesso em Ciência e Tecnologia

Criada em 11/03/2012 23:53 por maperna | Marcadores: fen geral

 

Quinta-feira, 08 de Março de 2012

 

Fonte: Rogério Cerqueira Leite(*), Folha de São Paulo de 06.03.2012

 

 

Os cortes em ciência condenam o País ao subdesenvolvimento; a aversão dos economistas por tecnologia, preferindo fazer o País pagar royalties, é desastrosa. Em relação ao ano de 2011, o orçamento federal de 2012 para o setor de ciência e tecnologia teve um acréscimo de cerca de 20%.

Exultaram os membros da comunidade acadêmica nacional. Todavia, esse aumento meramente corrigia uma redução de cerca de 10% ocorrida entre 2010 e 2011, além das perdas devidas à inflação ocorrida em 2010 e 2011. Ou seja, o orçamento de 2012, que aparentemente apresenta um ganho de 20% com relação a 2011, apenas restaura o valor de 2010. Fomos iludidos.

Pois bem, não bastasse esse logro, a administração atual impôs um corte de 22% no orçamento do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação. Como 70% desses recursos se referem a custos fixos (salários, impostos etc.), pouco ou nada resta para os projetos, mesmo aqueles que já estão em andamento. Isso terá como consequência a existência de perdas não só de tempo, mas até mesmo de investimentos já realizados.

É interessante notar a diferença entre educação, que não teve cortes, e o setor de ciência e educação. Nenhum cidadão consciente proporia cortes em educação. Mas é bom notar que, se educação tem consequências imediatas, algo que se exprime no acesso ao emprego, a ciência e a tecnologia representam o desenvolvimento econômico e social futuro do País.

A forte correlação entre o investimento em pesquisas e PIB per capita das nações é prova suficiente. Mas de quem seria a culpa senão de David Ricardo (1772-1823), com seu "teorema dos custos comparativos"? Essa é a única doutrina sobre a qual todos economistas, exceto talvez Arghiri Emmanuel, estão de acordo. Mas ela, não obstante, é obtusa.

Explico-me. De acordo com essa teoria, se o Brasil produz soja a custos menores que o Japão e o país asiático produz eletrônica a custos menores que o Brasil, então o ganho global será maior se o Brasil se concentrar na produção de soja - e se o Japão se dedicar à eletrônica. Adotando-se essa doutrina para todos os itens de troca internacional, o Brasil estará sendo condenado indefinidamente à produção de itens de baixo valor agregado, ou seja, ao subdesenvolvimento.
Isso acontecerá inexoravelmente se o Brasil continuar sendo impedido de realizar pesquisas.

Diz-se que Mário Henrique Simonsen, o gênio, teria argumentado: "Se pagamos apenas US$ 200 mil de royalties, então para que gastar com pesquisas em ciência e tecnologia?". Hoje, pagamos US$ 10 bilhões de royalties. Mas isso é apenas a ponta do "iceberg".

A consequência desastrosa da aversão que os economistas tradicionalmente sentem por tecnologia é a incapacidade que tem o Brasil hoje (e, pelo jeito, continuará tendo no futuro) de competir no campo de manufaturados e outros produtos de alto valor agregado, por falta de competência tecnológica. Mantega imita Simonsen, para a desgraça do Brasil.

Enquanto na China 80% dos cargos de decisão são ocupados por engenheiros, no Brasil são economistas, quando não advogados, que decidem. Talvez esse fato explique o desenvolvimento modesto do Brasil em comparação com o da China. 

(*)Rogério Cezar de Cerqueira Leita é físico e professor emérito da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).




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Em 12/03/12 23:25 Allan Cascaes Pereira disse:

Entendo a preocupação do colega mcs para não se cultive no meio acadêmico um sentimento de aversão aos economistas. Creio inclusive que não foi esta a intenção do Prof. Rogério Cesar. Entretanto, devemos reclamar, sim, da forma pouco responsável com que o desenvolvimento tecnológito é encarado no Brasil. Se desejamos um maior desenvolvimento do país, no futuro, devemos fazer coro com as palavras do Prof. Rogério Cesar Cerqueira. Obrigado pelas verdades que foram ditas.

Em 12/03/12 14:20 mcs disse:

Não gostei da publicidade deste artigo dentro do meio acadêmico de engenharia, pois, o autor desconhece sobre as teorias econômicas de fato como são abordadas, e, ainda, gera uma aversão aos profissionais de economia de forma inconsistente. Obviamente que assim como ele, todos nós estamos profundamente tristes com os poucos investimentos em tecnologia neste país e no setor de empreendedorismo, o que faria alavancar nossa economia, porém, gerar aversão aos profissionais das demais classes não foi ético, e, tal expressão de opinião dentro do meio acadêmico para jovens que estão se formando em engenharia e somente possuem uma disciplina em economia que aborda os modelos econômicos en passant não permite a reciprocidade e respeito acadêmico e profissional para com os demais profissionais que constituem a formação da sociedade contemporânea.