História da Engenharia Nacional: Carro Movido a Cachaça

Criada em 14/03/2011 00:50 por maperna | Marcadores: fen geral MECAN

Trabalhos do tio-avô do prof. Manoel Antonio, engenheiro Ernesto Lopes da Fonseca Costa. A Profa. Norah, aposentada da FEN, fez parte da sua equipe no INT.

publicado em:

http://www.gasvirtual.com.br/materia_auto.htm

 

PRA QUEM GOSTA DE AUTOMOBILISMO
Carro movido a cachaça


ERNESTO LOPES DA FONSECA COSTA


(Fritz Utzeri - Jornal do Brasil - 24/08/1980 - FE 24/02/2003)

UM ENGENHEIRO PREVÊ A CRISE, EM 1925

"Comprehende-se bem, portanto, que o abastecimento de petróleo se tenha tornado o eixo de gravitação da política internacional." A frase, hoje, pode parecer banal, mas quando foi dita, o aiatolá Khomeiny era um jovem de 24 anos e muitos dos potentados da OPEP ainda usavam fraldas. Não havia Estado de Israel, conflitos entre árabes e judeus ou perspectivas, mesmo remotas, do uso do petróleo como arma.

Apesar disso, a frase não foi obra de nenhum profeta mas de um simples engenheiro civil, Ernesto Lopes da Fonseca Costa, que fez uma conferência na Escola Polytechnica do Rio de Janeiro, em 1925, sobre O Álcool como Combustível Industrial no Brasil. Algum tempo antes ele adaptara uma baratinha que correu no Circuito da Gávea, abastecida com "aguardente de 70 graus, Gay Lussac", com um consumo, ótimo para a época, de 5 quilômetros por litro.


"PRODUCÇÃO INSUFFICIENTE"

O trabalho do engenheiro, que dirigia a Estação Experimental de Combustíveis e Minérios, foi publicado em 1927 e no pequeno fascículo amarelado pelo tempo há uma foto do automóvel Ford "que fez os percursos Rio-São Paulo, Rio-Barra do Pirahy e Rio-Petrópolis, com álcool de 70 gráos, dirigido pelo engenheiro Souza Mattos".

O engenheiro pode ser visto, de capuz, óculos e guarda-pó, como os chauffeurs de seu tempo, sentado ao volante do fordeco sujo e cheio de faixas do "Ministério da Agricultura, Indústria e Commércio", com a informação: "Álcool".

Em seu trabalho, ele começa afirmando que "as applicações que tem recebido o motor a explosão nestes últimos 20 annos, crearam para as nações civilizadas o importantíssimo problema de abastecimento em combustível volátil".

Depois de fazer o elogio do motor, que permitiu ao homem "a mais audaciosa de suas aspirações", o avião, na época ainda uma novidade tratada como "o limite da imaginação", o autor desce a considerações atualíssimas.

Elle nos informa que as reservas de petróleo não se encontram igualmente disseminadas pelo planeta e afirma, textual: "Por outro lado, a producção mundial de petróleo começa a se tornar insuficiente para o consumo, que não se tem mantido estacionário, mas cresce de forma inquietadora." E vai além: "Em 1920, o consumo de petróleo no mundo já era de cerca duas mil vezes o de 1860."


"RESERVAS EXGOTADAS"

Ernesto Lopes da Fonseca Costa previa que "as reservas mundiaes, conhecidas estarão exgotadas em cerca de 80 annos apenas", o que nos remete para o ano 2005, previsão que continua válida até hoje, como continua a sangria de divisas com a importação de óleo. Só que naqueles idos as divisas eram mais sólidas, pois em lugar de dólares gastávamos ouro.

"No Brasil a a importação de gazolina e kerozene já contribue muito para o êxodo de ouro. Só nestes dois derivados de petróleo consumimos, em 1924, 102 mil 500 Contos de Réis." Apesar de informar que "a nossa importação cresce de anno para anno", o engenheiro, certamente, ficaria estarrecido com a nossa realidade atual. Todo o dinheiro, ou mais precisamente o ouro, usado para comprar derivados em 1924 corespondem hoje, duas reformas monetárias depois, a apenas Cr$ 102 mil 500, suficientes para pagar 2 mil 500 litros de gasolina comum.

A preços de então, o Brasil todo só poderia gastar hoje sete litros de gasolina por dia.

O conferencista cita a guerra por reservas petrolíferas e fala "do ardor dos sábios que procuram em seus laboratórios realizar a synthese do producto que a actividade humana vae tornando tão escasso". Apesar dos esforços da Sciência e da informação que, já em 1855, "o grande sábio francês Bertholet obteve a synthese do petróleo pela hidrogenação de substâncias orgânicas", nada se conseguiu nesse terreno e, ainda hoje, é imposslvel obter petróleo sintético em escala industrial e preços competitivos, mais ou menos pelos mesmos obstáculos apontados então: "pressões elevadíssimas de difícil obtenção" e a necessidade de atingir temperaturas altíssimas para permitir a síntese.


"PRODUCÇÃO ÓPTIMA"

Já naquele ano experiências realizadas em Cuba e África do Sul mostravam que era possível apelar para fontes alternativas de energia capazes de mover motores a explosão. As mais comuns eram misturas de álcool com éter, ou ether como escrevia o engenheiro, com benzol ou mesmo com gasolina, em proporções que variavam de 10% a 50%. No Brasil, desde 1931 o decreto 19.707 tornava obrigatória a adição de 5%, de álcool à gasolina.

Ernesto Lopes da Fonseca Costa defendia o uso do álcool de baixa concentração, produzido no país, como a solução para o problema de combustível. "Possuímos magnífico solo e clima para a producção de matérias amylaceas e assucaradas, já fabricamos mesmo cerca de 150 milhões de litros de álcool por anno, isto é, mais de 70 vezes o nosso consumo de gazolina e kerozene".

Com essa idéia o engenheiro passou a trabalhar no projeto de adaptar o motor de seu Ford, constatando logo - no plano teórico - que combustíveis de menor poder calorífico (o álcool é menos calórico que a gasolina) tém um consumo maior - cerca de 25% a mais usando-se álcool a 96° GL. Outro incoveniente que encontrou foi a oxidação parcial das frações de álcool que escapam à combustão e transformam-se em "aldeydo, promovendo várias perturbações no motor pelo ataque às válvulas e às paredes internas do cylindro".

Mas o engenheiro já ressaltava que com o álcool de alto grau (o álcool hidratado vendido atualmente no país é de 96 graus Gay Lussac, sendo assim de alto grau) esses problemas eram grandemente diminuídos, principalmente quando se mistura o álcool ao éter ou à gasolina. Nas diversas experiências realizadas pelo engenheiro chegou a ser usado álcool a 50 graus GL e mesmo nessa concentração baixa foi possível mover o automóvel, desde que a temperatura do combustível não descesse a menos de 19 graus centígrados, o que era feito pelo gás do escapamento.

O teste definitivo foi em agosto de 1924, quando um carro Ford provido de aquecedor de ar e abastecido com aguardente" a 70 GL estreou no Circuito da Gávea percorrendo 230 quilômetros, dirigido pelo engenheiro Souza Mattos. Detalhe: foi o único automóvel de seu tipo que completou a corrida.

Daí em diante o álcool ganhou importância e nos anos 30 existiam no Rio cinco postos de gasolina que vendiam álcool combustível, a Azulina, Motorina, Alcoolina ou Usga, algumas marcas produzidas principalmente no Nordeste onde em 1929 já se vendiam 450 mil litros de álcool combustível todos os meses.


Por Fritz Utzeri.
Notas da Redação:

Este artigo foi publicado em 1980, exatamente no momento em que os EUA fomentavam a guerra entre o Iraque e o Irã com o intuito de derrubar o governo iraniano do então aiatolá Khomeiny. Naquele momento o Iraque de Saddam Hussein era fortemente armado, inclusive com ogivas químicas para serem utilizadas contra o vizinho. Sequer se tinha a noção de que uma década depois o mesmo Iraque iria tentar expandir-se ocupando o Kuwait, provocando assim a chamada Guerra do Golfo. Também não se imaginava que o consumo do petróleo descontroladamente, sem investimentos em tecnologias que o substituíssem, viria ainda a criar o clima de extremos em que vivemos nos dias de hoje, 23 anos depois da publicação deste artigo e 77 anos depois da apresentação da Conferência na Escola Polytechinica do Rio de Janeiro por este genial Engenheiro Ernesto Lopes da Fonseca Costa, um brasileiro com uma visão estratégica invejável para sua época, que realizou muito e, que se a ele os governos tivessem dado mais atenção, hoje o Brasil estaria em outro patamar no desenvolvimento de pesquisas em diversas áreas ligadas no emprego da tecnologia.

Mas quem foi, afinal Ernesto Lopes da Fonseca? Quem foi este fantástico brasileiro que nos deixou há 50 anos, completos em dezembro de 2002?

Seguem abaixo dois registros realizados após seu falecimento, que se encontram editados em uma singela publicação "In Memoriam Fonseca Costa", datado de 1953, pertencente a Sra. Glória Maria da Fonseca Costa, uma de suas filhas, a quem também prestamos homenagem por sua dedicação e maestria na área da música, sendo excepcional pianista e professora de piano, lecionando ainda hoje para diversos novos expoentes e solistas da nova geração pianistas brasileiros:


ERNESTO LOPES DA FONSECA COSTA 
(Eng. Othon H. Leonardos - Revista Engenharia, Mineração e Metalurgia, dezembro/1952 - FE 23/02/2003)

A pequena turma que concluiu o curso de engenheiros geógrafos em 1911 e em 1913 o de engenheiro civis, na Escola Politécnica do Rio de Janeiro, singularizou-se como fonte de professores dessa venerada academia: Sebastião Sodré da Gama, Octalício Novaes da Silva, Gualter de Macedo Soares, Edminudo Franca do Amaral, Francisco Sá Lessa, Augusto Paranhos Fontenelle, Allyrio Hugueney de Mattos e, finalmente, Ernesto Lopes da Fonseca Costa, que em 1928 sucedeu a Ferdinando Laboriau , na cátedra de Metalurgia.


Quando lhe falhou o coração, a 14 de dezembro de 1952, achava-se Fonseca Costa em atividade, com os seus 60 anos cheios de entusiasmo, engendrando novos planos no Conselho de Minas, no Instituto de Tecnologia, na Escola de Engenharia e no Conselho de Pesquisas embora, já soubesse contados os seus dias.


Descendente de tradicionais famílias brasileiras seguiria Ernesto, com dedicação, a carreira do pai - o engenheiro Caetano Pinto da Fonseca Costa, saído dos bancos da Politécnica em 1883. Seu avô paterno, o Marechal João da Fonseca Costa, recebera do Imperador o título de Visconde da Penha; seu bisavô, Manuel da Fonseca Costa, o de Marquês da Gávea. Fora este um dos mais íntimos do Duque de Caxias e de seu irmão, o Conde de Tocantins, cuja neta, dona Maria da Glória Cosme Pinto, esposou Ernesto dando-lhe duas filhas, as senhoritas Maria da Penha e Glória Maria da Fonseca Costa. Dona Ernestina Lopes da Fonseca Costa, sua mãe, de quem herdou o prenome, era irmã do engenheiro Ildefonso Simões Lopes, o qual, quando Ministro da Agricultura, muito se valeu da dedicação de seu sobrinho Caetanao Lopes da Fonseca Costa na chefia de seu gabinete. Ao outro irmão de Ernesto, o almirante Ayres da Fonseca Costa confiou a Marinha a construção da fábrica de canhões da Ilha das Cobras.


"Les bleus seront toujours des bleus" - disse Lamartine. A respeito de sua extrema simplicidade, sempre demonstrava o professor Fonseca Costa, na impecabilidade de seus atos, o azul da sua ascendência. "Não conheço inteligência mais bela que a sua" - repetia o saudoso engenheiro Luiz Betim Paes Leme. Além da inteligência, um autêntico caráter. Seu prazer máximo consistia em ajudar quem quer que fosse, nos problemas mais transcedentes e, discretamente, eclipsar-se no sucesso dos discípulos. Neste sentido, sua vida tinha algo de semelhante à de um de seus mestres mais queridos: Luiz Felippe Gonzaga de Campos, sucessor de Derby na direção do antigo Serviço Geológico e Mineralógico do Brasil.


Foi a partir de 1920, ano em que ingressamos no Serviço Geológico, que passávamos a estreitar relações com esse espírito privilegiado. A sala do diretor Gonzaga, na Praia Vermelha, era um centro incomparável de erudição, com a presença costumeira de expoentes da época, interessados todos no desenvolvimento de nossos recursos naturais: Antônio Olinto dos Santos Pires, Arrojado Lisboa, Capistrano de Abreu, Cincinato Braga, Souza Bandeira, Luiz Betim, Fleury da Rocha, Pires do Rio, T. H. Lee, Horace Williams, Paula Oliveira, Theodoro Sampaio, Alberto Betim, Mindello, Fonseca Costa e tantos outros. Semana não se passava sem que o próprio Ministro não viesse "bater um papo" com Gonzaga e seus amigos, fugindo assim aos políticos que o assediavam com pedidos. A verba total do Ministério da Agricultura era, naquela época, verdadeiramente ridícula; mas Simões Lopes estava sempre disposto a apoiar quaisquer iniciativas do Serviço Geológico.


Foi numa das reuniões, na Praia Vermelha que Fonseca Costa sugeriu a criação de um laboratório para ensaio de nossos combustíveis e minérios, o qual surgiu como surgem hoje as "favelas"- no sopé do morro da Babilônia, entre os fundos do Hospício e o Túnel do Leme. Em precaríssimos barracões improvisaram-se tôscas gigas, mesas vibrantes e células de flutuação com que se fizeram os primeiros estudos de lavabilidade dos carvões do Rio Grande e Santa Catarina, e de aproveitamento dos resíduos piritosos, inclusive com um processo de redução da pirita ao estado de enxôfre elementar, experimentado por Le Gall. As idéias reunidas, de Gonzaga e Fonseca, eram como misturas explosivas: raciocinavam como se o Brasil já estivesse suficientemente maduro para aproveitar suas riquezas potenciais e evitar as restrições verificadas durante a primeira Guerra Mundial. Na realidade o país continuava ainda na fase de colônia agrícola, explorando (ou melhor, devastando) suas terras mais ricas. Sua incipiente indústria, na maioria dos casos só tinha de nacional o barulho das máquinas importadas. Falar em pesquisa, naquela época era uma heresia.


Mas o fato é que, em 1922 a despeito da hostilidade ambiente, já se colhiam ótimos frutos da Estação Experimental de Combustíveis e Minérios, que como uma célula viva, separava-se cariocineticamente do velho Serviço Geológico.


Se ao professor Fleury cabe a honra de ter realizado em 1920-21, na Europa as conclusivas experiências de coqueificação de nossos carvões do Sul, teve Fonseca Costa o mérito de reunir no Rio de Janeiro, em fins de 22 o marcante primeiro Congresso Brasileiro de Combustíveis, em que foram apresentados os resultados daqueles ensaios e onde, pela primeira vez, se debateram amplamente as características dos carvões nacionais, as nossas possibilidades de petróleo, o problema da destilação dos folhenos pirobetuminosos, etc.


No começo de sua carreira, Fonseca Costa dedicou-se pessoalmente às pesquisas tecnológicas executando, entre muitas coisas, a fabricação de ligas, em fornos elétricos utilizando minérios ferro-manganesíferos não exportáveis e combustíveis inferiores - como o linhito de Caçapava; o estudo do rendimento na fabricação do álcool e o emprego do álcool como folhenos oleígenos da bacia do Paraíba, antes da sua pirogenização; o estudo da redução dos minérios de ferro em baixa temperatura, com combustíveis pobres (concluindo afinal pela sua inviabilidade prática e descorçoando os industriais que pretendiam aqui instalar uma usina siderúrgica trabalhando pelo processo Smith); a fabricação de refratários com a baddeleyita de Caldas e seu emprego nos fornos elétricos. Quando se instalou a fábrica de cimento Perús, deparou essa indústria com o problema de não conseguir um produto dentro das especificações no tocante à magnésia - donde a recusa, por parte das grandes obras (como as que a Light vinha executando em São Paulo, por exemplo), de aceitar o então único cimento nacional; Fonseca Costa investigou o assunto e garantiu a improcedência dos receios, mostrando ser pouco provável que o magnésio, no seu estado em que se encontrava, pudesse ter efeitos nocivos. Blocos de concreto preparado com cimento Perús acham-se, desde aquela época imersos nas águas da Guanabara e do porto de Recife, sendo ensaiados de tempos em tempos e comprovando sempre as afirmações do mestre.


Fonseca Costa chegaria a chamar a atenção do Governo para o fato de que as nossas matérias-primas vegetais e animais estavam também a merecer estudos tecnológicos; daí o seu propósito de transformar a Estação Experimental de Combustíveis e Minérios em um Instituto Nacional de Tecnologia. Levada a idéia ao Presidente Washington Luiz, este lhe prometeu apoio, cedendo para a instalação dos novos laboratórios um terreno próximo ao Cais do Porto. Não foi possível entretanto, conseguir verba para a construção do edifício. Houve, por isso surpresa, quando começaram a se levantar as paredes do prédio à Avenida Venezuela. - De onde estaria saindo o dinheiro? - indagavam as más línguas. Na realidade o que estava acontecendo era que o próprio pessoal do Instituto resolvera explorar a pedreira situada nos fundos da Estação Experimental. E quem recusaria a Fonseca ceder-lhe um caminhão desocupado, a fim de transportar este ou aquele material para as suas obras? A Perús, que não conseguira fazer com que esse homem extraordinário aceitasse qualquer gratificação pelos valiosos serviços a ela prestados, sentiu-se feliz em poder fornecer-lhe o cimento; a Cia. Cerâmica Brasileira ofereceu os ladrilhos; Klabin, os azulejos; as usinas siderúrgicas nacionais disputaram entre si a honra de contribuir com os vergalhões de aço… E foi assim que surgiu, como num conto de fadas o Instituto Nacional de Tecnologia.


Terminavam ainda as primeiras instalações quando a Revolução de 30 reviravolteou a administração pública. Instalaram-se as famosas comissões de inquérito. O caso do INT aparecia como um possível escândalo do governo deposto. Cedo porém verificou-se que quase tudo alí fôra obra graciosa, trabalho devotado de técnicos esquivos à publicidade, uma realização, enfim dentre as que mais poderiam honrar um país nos seus anseios de industrialização. A guisa de reparação moral Arthur Neiva nomeado diretor geral do novo Departamento de Pesquisas imaginado pelo ministro Juarez Távora, veio instalar-se no próprio gabinete do Diretor do Instituto Nacional de Tecnologia, ao lado de Fonseca Costa, a fim de levarem mais longe um programa feito em comum.


Com a ulterior criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, o Instituto a ele se subordinou tamando maior incremento.


Já o diretor Fonseca Costa quase não dispunha de tempo para realizar pesquisas individuais, dedicado que se encontrava a incentivar as investigações de seus auxiliares. Mas todo o seu escasso tempo de folga, dispendia-o em seu novo Laboratório de Metalografia realizando ainda, esporadicamente, valiosas pesquisas tecnológicas, sobretudo quando surgiu a necessidade de se investigar mais profundamente a causa de certos acidentes - como estas recentes rupturas da adutora de Ribeirão das Lajes.


De nada se orgulhava mais o esplêndido mestre do que do grupo de pesquisadores que ele conseguira criar nos seu querido INT, já agora com dez Divisões e várias secções autônomas. Recordaremos os nomes de alguns desses discípulos: Na Divisão de Insdústrias Químicas Inorgânicas, Prof. Sylvio Fróes Abreu, sucessor de Fonseca Costa na Diretoria Geral, e os químicos Rubem Roquette, Yvonne Stourdze Visconti, Antonietta Cantição e Nilza Hasselmann de Figueiredo; na de Indústrias Químicas Orgânicas, Paulo Barbosa Carneiro, que tanto brilhou atuando na UNESCO, e os químicos-vegetais Abraão Yachan, Ruben Descartes de Garcia Paula, Moacir Silva e José Luiz Rangel; Eros Orosco e Arnaldo Feijó, no setor metalúrgico; no ramo das Indústiras de Construção, os engenheiros Paulo Pereira e Mario Brandi; nas Indústrias Têxteis, Dr. Antônio Schmidt Mendes; Geraldo de Oliveira Castro, no Laboratório de Borracha e Plásticos; na Divisão de Eletricidade, o Dr. Bernhard Gross, autoridade mundial em raios cósmicos, e os físicos Gunther Kegel, Leda Lacerda e Arthur Aaron; no Setor de Combustíveis e Motores Térmicos, o Engenheiro Heraldo Mattos; e finalmente Fleming Axel Zeemann, no setor de Cerâmica.


Logo após graduar-se em engenharia Fonseca Costa prestou serviço na antiga Repartição de Águas e Esgotos; foi depois diretor técnico das companhias de Energia Elétrica e Viação Urbana de Belo Horizonte e Elétro-Metalúrgica de Ribeirão Preto. Também membro da Comissão de Similares e presidente da Comissão de Álcool-Motor, que deu origem ao Instituto do Álcool e Açúcar; da Comissão de Metalurgia, que propôs a criação da Companhia Siderúrgica Nacional; do Conselho Nacional do Petróleo; membro, ainda, de outras comissões de estudos, tendo comparecido a vários congressos no estrangeiro.


Foi professor de metalurgia na Universidade Católica e na Escola Técnicoa do Exército. Realizou em 1932 um curso sobre energia elétrica, na Sorbonne, tendo recebido nessa ocasião título de professor "honoris causa"da Universidade de Paris. Pelos relevantes serviços prestados à Marinha Brasileira, durante a Segunda Guerra, recebeu a medalha do Mérito Naval. Mereceu, também, a medalha de ouro da Associação Brasileira de Metais, e outras honrarias.


Durante anos dirigiu os trabalhos do Conselho Nacional de Minas e Metalurgia, com tal prestígio que todas as discussões por mais acaloradas que as houvesse, terminavam sempre em votação unânime. Jamais impunha ele a sua opinião nem encerrava qualquer debate enquanto não se convenciam todos diante dos argumentos mais justos. Questões como as do carvão nacional, dos fertilizantes, etc., que ele considerava entre as mais importantes nunca tiveram ponto final: "São problemas permanentemente em ordem do dia" - declarava sempre. E exemplificava: - Como poderemos concordar que os desavisados engenheiros da Prefeitura queimem o tão volumoso quanto tão valioso lixo da cidade, desperdiçando seu conteúdo de materiais fertilizantes, quando na própria Capital Federal vive-se à mingua de alimentos por causa da escassez de humus e elementos nobres no solo da Baixada Fluminense?


Não tendo, por proibição médica, podido comparecer à última reunião do Conselho de Minas, mandou a seus colegas, em 11 de dezembro, juntamente com uma delicada mensagem de Natal a sua derradeira indicação, neste termos:


"Senhores Conselheiros:


Cabendo ao Conselho Nacional de Minas e Metalurgia orientar os Poderes Públicos no que se relaciona ao desenvolvimento e progresso da indústria metalúrgica no Brasil, e considerando que tal desenvolvimento e progresso não poderão ser realizados apenas se nos basearmos na experiência alienígena, dadas as condições especiais dos nossos minérios, combustíveis, fontes de energia, etc., proponho que seja organizado por este Conselho um programa de pesquisas científicas e tecnológicas que interessem diretamente à siderurgia e à metalurgia de metais não ferrosos, a fim de ser o mesmo encaminhado ao Conselho Nacional de Pesquisas, órgão indicado para apoiar e financiar tais empreendimentos.


Sugiro portanto que seja reservada uma semana no mês de janeiro do ano vindouro para a elaboração de tal programa e sejam convidados a colaborar com este Conselho técnicos de institutos científicos e de companhias especializadas no assunto". - Fonseca Costa.


Seu corpo foi sepultado, diante da consternação de amigos ilustres, no Cemitério de São João Batista, onde o Almirante Alvaro Alberto, em nome do Conselho de Pesquisas e os engenheiros Flávio Ribeiro de Castro e Mário Pinto, respectivamente no de seus colegas de turma e no da Academia Brasileira de Ciências, disseram da saudade que a todos empolgava. O magnífico exemplo de Ernesto Lopes da Fonseca Costa, os frutos de suas pesquisas e lições, perdurarão todavia, e os estudiosos de amanhã reconhecerão que ele realmente foi como disse o Presidente da República, um grande brasileiro!

A MORTE DO PROF. FONSECA COSTA

(Ministro Ivan Lins - Correio da Manhã - 16/12/1952 - FE 23/02/2003)

Imenso claro abriu-se no campo das ciências e das pesquisas tecnológicas do Brasil com o falecimento do engenheiro Ernesto Lopes da Fonseca Costa, catedrático de Metalurgia da Escola Nacional de Engenharia, ocorrido no domingo último. Homem de sólida e variada cultura científica, em condições de discorrer sobre qualquer aspecto de problemas das ciências naturais, que da matemática, quer da física ou da química, dominando as mais recentes teorias, e conquistas da física nuclear, era ainda um pesquisador de excepcional mérito. Preocupado desde a mocidade com a determinação das características das matérias primas do Brasil, foi ele quem fundou em 1922 a Estação Experimental de Combustíveis e Minérios, empreendimento em que foi incentivado pelo geólogo patrício Gonzaga de Campos. Dedicou toda a sua vida aos grandes problemas econômicos nacionais, no campo do carvão, do petróleo, do álcool-motor, do manganês e de todas as indústrias básicas.


Num tempo em que a pesquisa pura no Brasil era senão uma utopia, uma temeridade, pela incompreensão geral dos governos e do público, Fonseca Costa entregou-se, com idealismo ao seu cometimento científico e conseguiu - sabe-se lá através de quantas lutas e sofrimentos - transformar a primitiva Estação Experimental de Combustíveis e Minérios no atual Instituto Nacional de Tecnologia, para onde atraiu uma pleiade de pesquisadores que já tem dado prova de que o Brasil é capaz de realizar no domínio da pesquisa pura e do campo tecnológico.


Eis aqui apenas alguns nomes dos cientistas que Fonseca Costa agremiou em torno do seu Instituto: Paulo Sá, Sylvio Fróes Abreu, Bernhard Gross, Eros Orosco, Gomes de Faria, Lobo Carneiro, Arnaldo Feijó, Oliveira Castro, Fernando Lobo Carneiro, Rubem Descartes, Moacir Silva, Schmidt Mendes, José Luiz Rangel Roquette.


Convencido de que a opulência industrial da América do Norte se deve, em grande parte, aos institutos e laboratórios de pesquisa de que são exemplos, entre centenas de outros, o "Bureau of Standard"," o "Bureau of Mines", e a "Carnegie Institution", operou Fonseca Costa o milagre de organizar o "Instituto Nacional de Tecnologia", abrangendo os seguintes setores:


1) Indústrias Químicas Inorgânicas;


2) Indústrias Químicas Orgânicas;


3) Indústrias Metalúrgicas;


4) Indústrias de Construção;

5) Indústrias de Fermentação;


6) Indústrias Têxteis;


7) Combustíveis Industriais e Motores Térmicos;


8) Divisão de Metrologia;

9) Divisão de Eletricidade e Medidas Elétricas;


10) Laboratório de Borracha e Plásticos,


além de um serviço modelar de desenho e de uma explendida Biblioteca científica e tecnológica. Quem conheceu na Praia Vermelha, a humilde Estação Experimental de Combustíveis e Minérios, montada em galpões instalados em terrenos do antigo Serviço Geológico e hoje contempla o palácio de pesquisas que Fonseca Costa conseguiu erguer na Av. Venezuela, não pode deixar de concluir que o fundador do Instituto Nacional de Tecnologia realizou o ideal de Alfred de Vigny nos versos famosos:


"Qu' est-ce qu'une grand vie? Une pensée de la jeunesse, exécutée par l'áge mur..."


Mas o que tornava Fonseca Costa uma personalidade invulgar não era só a sua polimorfa inteligência: eram ainda a bondade e seu trato pessoal de uma delicadeza e fidalguia extremamente raras. Era um cientista forrado de gentleman, sentindo-se tão à vontade no seu laboratório de pesquisas, quanto nos salões da sociedade mais requintada. Lembrava diante do seu fôrno metalúrgico, a figura do Marquês de Buffon ao escrever com punhos de renda as páginas de sua "História Natural".


Apesar dos altos cargos que desempenhou, nunca soube o que era a "importantite". Mas a sua bondade não jazia apenas no fundo do seu coração; extravasava-se através de seus gestos. Ninguém mais do que ele praticou a polidez, que os moralistas consideram o primeiro grau de virtude, pois os ensina, em coisas secundárias e pequeninas, mas constantemente renovadas, a nos vencermos em favor dos outros. Para todos os seus subordinados, desde os mais graduados aos mais humildes, era, antes de tudo, o amigo solicito e prestimoso.


Nos primeiros dias do mês corrente, recebeu o Dr. Fonseca Costa, um ofício do ex-Prefeito João Carlos Vital, solicitando a colaboração do Instituto Nacional de Tecnologia para as pesquisas da causa das rupturas que vêm ocorrendo nos tubos da segunda adutora de Ribeirão das Lajes. Interessado em fornecer todos os subsídios de ordem técnica especializada, indispensáveis à Comissão nomeada para estudar o caso, chamou o Dr. Fonseca Costa, diretamente a si, a orientação dos trabalhos a serem realizados, não obstante o seu já precário estado de saúde. Traçados por ele as linhas mestras a seguir, prosseguiu o Dr. Feijó, diretor da divisão de Indústrias Metalúrgicas do Instituto de Tecnologia as pesquisas, dando a cada passo, por telefone, ao Dr. Fonseca Costa, notícias do desenvolvimento do trabalho por ele planejado. E assim, em cerca de dez dias apenas, foram obtidas as conclusões documentadas sobre as causas das avarias - exatamente as formuladas em hipótese prévia pelo extinto: a "stresse-corrosion". Esse resultado causou espanto aos engenheiros norte-americanos especialmente vindos ao Rio para estudar in loco o caso e que concordaram plenamente com as conclusões, pois eram as mesmas a que haviam chegado nos Estados Unidos, após estudarem rupturas ocorridas em adutoras instaladas na Venezuela. Ainda horas antes de falecer, ocupou-se o Dr. Fonseca Costa com o assunto em companhia do Dr. Arnaldo Feijó.


Por atribuição do Presidente da República, vinda ainda o Dr. Fonseca Costa realizando estudos para a verificação das especificações relativas ao trator Fiat, modelo 25R. a ser produzido pela Fábrica Nacional de Motores, para revenda aos agricultores do país.


São os seguintes os principais dados bio-bibliográficos do Dr. Fonseca Costa:


Nasceu em 22 de junho de 1891, sendo filho do engenheiro Caetano Pinto da Fonseca Costa e de Dona Ernestina Lopes da Fonseca Costa, irmão do saudoso Dr. Ildefonso Simões Lopes. Descendia de uma das famílias mais tradicionais do Império, pois era neto do Marechal João da Fonseca Costa, Visconde da Penha e bisneto do íntimo amigo do Duque de Caxias, Manoel Antônio da Fonseca Costa, Marquês da Gávea. Deixa viúva Dona Maria da Glória Cosme Pinto da Fonseca Costa, neta do irmão de Caxias, Conde de Tocantins, e duas filhas, as senhoritas Maria da Penha e Glória Maria da Fonseca Costa. Era irmão do contra-Almirante Aires da Fonseca Costa. Formou-se em engenharia em 1913, pela antiga Escola Politécnica do Rio de Janeiro. Era professor catedrático, por concurso da cadeira de Metalurgia da mesma Escola, desde 1928. Fundador da antiga Estação Experimental de Combustíveis e Minérios do Ministério da Agricultura. Fundador e Diretor Geral do Instituto Nacional de Tecnologia. Professor "honoris causa" da Academia de Ciências da Universidade de Paris (Sorbonne), onde realizou, em 1932, um curso sobre Energia Hidráulica. Membro e atual Presidente do Conselho Nacional de Minas. Membro do Conselho Nacional de Pesquisas. Ex-membro do Conselho de Segurança Nacional. Professor e um dos fundadores da Escola de Engenharia da Universidade Católica. Ex-professor de Metalurgia da Escola Técnica do Exército. Ex-membro do Conselho Nacional do Petróleo. Recebeu a medalha do Mérito Naval pelos relevantes serviços prestados à Armada Nacional, pertencendo à Academia Brasileira de Ciências.


No início de sua vida profissional, como engenheiro, prestou serviços à antiga Repartição de Águas e Esgotos, onde serviu durante cerca de 2 anos. Foi também Diretor da Cia de Energia Elétrica e Viação Urbana de Belo Horizonte e Diretor Técnico da Cia Metalúrgica de Ribeirão Preto.


Além de todos esses encargos, exerceu ainda as seguintes comissões:


Membro da Comissão de Similares. Presidente da Comissão de Estudos do Álcool-Motor. Membro da Comissão organizada do Instituto do Açúcar e do Álcool. Membro de diversas comissões nomeadas pelo Governo para o estudo do contrato da Itabira Iron. Membro do Conselho de Recursos da Propriedade Industrial. Em 1939 foi designado pelo Governo para aquisição, em França, dos Padrões de Pesos e Medidas e prosseguiu nos estudos da fabricação do coque metalúrgico. Para tal fim visitou a Inglaterra, Alemanha e Suiça. Em seguida foi a Washington estudar a organização do Bureau of Standard. Em 1947, representou o Brasil no Congresso de Laboratórios.


Entre outras, deixa o Professor Fonseca Costa as seguintes publicações:


"Trabalhos feitos durante o ano de 1922 na Estação Experimental de Combustíveis e Minérios", 1926;


"O Álcool como combustível insdustrial no Brasil", 1927;


"Possibilidades econômicas do carvão de Santa Catarina", 1928;


"Carburante nacional", 1932;


"Notas em torno do problema siderúrgico nacional", 1935;


"Instituto Nacional de Tecnologia e seus fins", 1935 e


"Nota sobre a cinemática do sistema Fe-O-C", 1937.


Sepultou-se domingo último, no cemitério de São João Batista.

 

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Fonte: Prof. Manoel Antonio (MECAN)


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