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Oitocentos e quatorze mortos e 400 desaparecidos é o saldo provisório das enchentes nas Serras do Rio de Janeiro. Apenas 0,6% do orçamento federal para prevenção de enchentes foi repassado ao estado em 2010. Plano nacional de ação preventiva com radares no valor de R$ 115 milhões foi engavetado por dois anos; redefinido para descentralizar tarefas em parcerias com governos locais, ao custo de R$ 36 milhões, ainda assim os recursos não foram liberados. Ora, se sacerdotes do Egito antigo sabiam distinguir e prever as cheias e inundações do Rio Nilo sem os recursos tecnológicos de hoje, diante do quadro fático acima descrito a conclusão é que no Brasil emergente falta vontade política para evitar que submirjam a vida, a esperança e a felicidade de um povo que trabalha e paga 40% do PIB em impostos não empregados nos fins a que se destinam. A situação é inaceitável, mormente quando se vê que existem projetos não aproveitados e há verbas não empregadas, que afundam a decolagem de programas empacados pelo desrespeito, sobretudo, à lei orçamentária que anualmente contempla as políticas públicas (pleonasmo de ênfase, pois toda política é pública por definição), que não se vêem implementadas pelo desvio de finalidade dos recursos que deveriam concretizar as decisões magnas do Parlamento. A ridicularização do orçamento no Brasil chegou ao ponto de se cunhar o epíteto peça de ficção para significar o descaso do Executivo com o planejamento ("determinante para o setor público", conforme art. 174 da Constituição); mas não se deve esquecer que muitas vezes a Receita é superestimada para acomodar ações populistas ou emendas político-partidárias, tudo a indicar um conluio nefasto ao bem comum. E aí vêm os cortes ou os contingenciamentos da despesa... A Cidadania deve reagir com justa indignação. E os tribunais precisam proceder a um controle jurídico dos Orçamentos Públicos, sobretudo o Supremo Tribunal Federal, a quem incumbe a guarda da Constituição que está sendo desrespeitada (diga-se em abono ao STF que ele passou a admitir realizar esse controle, inclusive ordenando a realização de ações de saúde pública legisladas e não executadas, havendo ali inclusive manifestações em favor da determinação judicial de resguardo de direitos fundamentais em caso de omissão legislativa, ou inércia do Poder Público, por exemplo em relação a menores desamparados). Mas o STF precisa contar com a coragem das demais instâncias do Judiciário, como a de Minas Gerais que recentemente determinou que numa cidade em que grande parte população jovem está drogada pelo crack fosse construída uma clínica especializada no tratamento respectivo. A defesa da Secretaria de Saúde local foi a de sempre: "Falta de orçamento". Em outros casos, há orçamento mas não chega a verba, o financeiro. É o que se deu no caso das enchentes do Rio de Janeiro. A Constituição brasileira conjuga o objetivo fundamental de construção de uma sociedade justa e solidária (art. 3º) com a determinação de graduação da carga tributária consoante a capacidade econômica da cidadania (art. 145, § 1º). Ademais, a Carta Magna determina que a administração pública (e, nela, a administração fazendária) obedeça ao princípio da eficiência e da moralidade, entre outros (art. 37). Significa dizer que a repartição equitativa do gasto público se exprime por uma vertente tributária, relativa à captação de receita, e outra de natureza orçamentária, atinente à distribuição da despesa. O trato equitativo dos recursos públicos deve obedecer ao princípio fundamental da capacidade contributiva, quer na sua dimensão de potencial requisitório, quer no seu aspecto distributivo; ademais, a tributação completa sua conformação como processo financeiro justo na medida em que serve a propósitos de desenvolvimento socioeconômico através de políticas públicas preconizadas constitucionalmente ou acordes com os valores protegidos pela ordem jurídica. A repartição equitativa do gasto público exige eficiência e seriedade na gestão dos recursos arrecadados do Cidadão-Contribuinte; desta depende a intensidade da tributação e a qualidade do atendimento às políticas públicas definidas através das dotações orçamentárias. Políticas públicas eficientes podem poupar recursos, determinando a redução da carga tributária ou reduzindo as pressões pelo respectivo aumento. E podem prevenir ou minimizar calamidades, como as inundações. As finanças públicas nacionais não suportam orçamento ficção, carga tributária de Primeiro Mundo e serviços públicos de Terceiro Mundo. É preciso que o governo se reencontre com a Cidadania, a verdadeira destinatária da atividade do Estado, de molde a que os ideais do Constituinte não se percam na inconstitucionalidade ou na infidelidade, mas que se realizem plenamente através de políticas públicas probas e eficientes. O descaso político não pode condenar o país ao atraso no desenvolvimento socioeconômico sustentável. 25/01/2011 - 16:01 José Marcos Domingues Professor titular de Direito Financeiro da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, é coordenador do Núcleo de Estudos em Finanças Públicas, Tributação e Desenvolvimento (Nefit/Uerj). Fonte: Prof. Pecorelli |
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| Em 31/01/11 10:29 Weber Figueiredo disse:Pecorelli, boa iniciativa de retransmitir o artigo: "... A Cidadania deve reagir com justa indignação..." Sugiro ao prof. José Marcos elaborar a minuta de uma lei de responsabilidade ambiental que obrigaria os governantes a investirem em planejamento do uso do solo e profilaxia ambiental - obras invisíveis aos olhos (sic), que não geram votos. |