Discurso do Professor Ricardo Lira Ao Receber o Título de Prof. Emérito.

Criada em 03/10/2010 22:35 por maperna | Marcadores: art fen geral

Magnífico Reitor Ricardo Vieiralves, Magnífico Reitor de sempre Antonio Celso Alves Pereira, Magnífica Vice-Reitora Cristina Paixão Maioli, Magnífico Vice-Reitor Regazzi,

Exmas. Senhoras Sub-Reitoras, Exmos. Senhores Diretores de Centro Setorial, Exmo. Senhor Diretor da Faculdade de Direito, Professor Antonio Augusto Madureira do Pinho, Exma. Sra. Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Gama Filho, Professora Maria StellaAmorico, Exmo. Senhor Diretor do Departamento de Relações Internacionais da PUC / Rio de Janeiro, Professor João Pontes Nogueira; Exmo. Senhor Vice-Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Secção do Rio de Janeiro, Dr. Sérgio Eduardo Fischer, Exmo. Senhor Doutor Felipe Santa Cruz, Presidente da Caixa de Assistência dos Advogados, Exmo. Senhor Procurador Geral da Ordem dos Advogados do Brasil, Secção do Rio de Janeiro, Professor Ronaldo Cramer, Exmo. Senhor Presidente da Academia Brasileira de Letras Jurídicas, Prof. Francisco Amaral, Exmo. Sr. Dr. Roger Aguiar, Presidente da Academia Brasileira de Direito Civil, Exmos Ex-Presidentes ii o Instituto dos Advogados do Brasil, Dr. Benedito Calheiros Bonfim, Ivan Alkmim, Maria Adélia Campello e Henrique Cláudio Maués, Prezados Professores da Universidade, Queridos Professores da Faculdade de Direito, Minha mulher Magally, Meus filhos José-Ricardo e Jerônimo José,Meus demais familiares,  Minhas Senhoras, Meus Senhores,

 

Sejam de agradecimento as minhas primeiras palavras.

 

Agradecimento aos que compunham o Departamento de Direito Civil da Faculdade de Direito, liderados pelo meu eminente e fraterno amigo Gustavo Tepedino, que tiveram a iniciativa da outorga da emerência, agora formalmente por mim recebida, generosidade que excede de muito minhas singelas qualidades.

 

Agradecimento aos que, então, integravam o Conselho Departamental da Faculdade, e que homologaram a outorga.

Agradecimento aos que, então, compunham o Conselho Universitário.

 

E uma manifestação calorosa de agradecimento ao Magnífico Reitor Ricardo Vieiralves, que sempre teve presente em sua lembrança o gesto de entregar-me o honroso título de Professor Emérito desta Universidade, e cujas palavras nesta solenidade só se explicam pela sua generosidade sem tamanho e pela amizade que nos une há tanto tempo.

Igualmente, me tocam, me sensibilizam, levando-me a incontida emoção, as referências do meu eminente Mestre, Reitor de sempre Antônio Celso Alves Pereira, cuja palavra me vale permanentemente como conselho de sabedoria e fator de equilíbrio.

 

Lembro-me comovido do cotidiano de fidalguia e ternura que constituía a presença suave do Professor Bahia.

 

Permita-me a seleta platéia que eu reitere no que sempre tenho dito em eventos nesta UERJ, insistindo no que entendo deva ser uma Universidade hoje, nos difíceis tempos vividos nos primórdios deste século XXI.

 

A universidade clássica, fiel às suas origens, procurou mais isolar-se do que participar das perplexidades do seu tempo.

Cultivava o saber pelo saber, e essa segregação era ainda dominante em meados do século 18.

 

A missão da Universidade era a da guarda e transmissão do saber, com o que preservava o saber do passado e buscava o saber do futuro, sempre acastelada em uma posição de alheamento, dos negócios do mundo e de entrega aos prazeres do espírito.

Mesmo depois que aceitou a ciência experimental, nem por isso a Universidade se rendeu à pesquisa da ciência aplicada e se deixou envolver no mundo da vida.

Insistiu em acentuar o caráter "desinteressado" da sua busca e os objetivos "nobres" do saber pelo saber, do saber como fim em si mesmo. (ANÍSIO TEIXEIRA, "A Universidade de Ontem e de Hoje", in Educação e o Mundo Modernopags. 2221245).

 

Excetuada talvez a universidade americana, assim viveu a Universidade até fins do século XIX, quando começou a transformar-se pelos efeitos das três revoluções: a revolução científica, a revolução industrial e a revolução democrática.

 

A partir de então, esboçou-se no horizonte a sua faina dirigida a três objetivos fundamentais: o da formação e ensino, o da pesquisa e o dos serviços.

Sua história passa a ser, sob vários aspectos, o cenário de uma oscilação de ênfase em relação à maior ou menor importância dada a cada um desses "produtos universitários", se assim pode dizer-se.

 

Contemporaneamente, a Universidade parece romper o seu isolamento e se vai, aos poucos, enlaçando com os dados da vida, até configurar-se como uma instituição inteiramente nova, pela sua complexidade, pela sua variedade, pelo seu pluralismo.

 

Anotava agudamente ANÍSIO TEIXEIRA, nos anos 60, do século passado, que "são inúmeras as vozes a chorar pela antiga unidade, pela antiga homogeneidade, pela antiga qualidade, mas a força do tempo é maior e a universidade fez-se não a torre de marfim, mas talvez a Torre de Babel, com atividades intelectuais dos mais diversos níveis, com a mais extrema mistura de cultura teórica e prática e com tamanha população deprofessores e alunos que já não é mais uma comunidade, mas várias e contraditórias comunidades, lembrando mais a cidade, que o antigo claustro conventual da velha Oxford" (op. cit., pag. 227).

 

Hoje, dizemos nós, a UNIVERSIDADE não pode descartara sua participação no processo civilizatório, nem sufocar o seu desejo de mudança e transformação social.

É vital para a Universidade sofrer o impacto das forças vivas da sociedade, e, em resposta, sobre elas atuar.

 

A Universidade é necessariamente política, tomada a expressão na sua semântica mais pura e construtiva.

Resulta inevitável pague a Universidade um preço por essa sua identidade, e esse preço é a sua própria crise.

 

Tais circunstâncias geram contradições internas, suscitando a questão da compatibilidade entre elas, exigem o esforço para encontrar um ponto de equilíbrio, provocando a indeclinabilidade da gestão das tensões (vide BOAVENTURA DE SOUZA SANTOS, "Da Idéia de Universidade àUniversidade de Idéias", in Pela Mão de Alice – O Social e o Político na Pós-Modernidade, Cortei Editora, 2a edição, pags 190/191).

 

Foi partindo dessa concepção que, quando dirigíamos a nossa Faculdade de Direito, em 1987, sentimos a necessidade de instituirmos uma pós-graduação stricto sensu, fincada em uma área de concentração pioneira e desafiadora.

  

Preocupava-nos, como nos preocupa até hoje, a virada do cone ocorrida nos anos 50 do século passado , quando o Brasil, que era essencialmente agrícola, se tornou um país essencialmente urbano, com uma densidade demográfica nitidamente operada basicamente nos médios e grandes centros urbanos, com uma ocupação do solo realizada de modo inteiramente irregular e iníquo, por diversas causas históricas que no momento não vem a pelo mencionar.

 

Nos países subdesenvolvidos, nos países em desenvolvimento, e nos países emergentes, a ocupação do espaço urbano se faz marcada pelo déficit habitacional, pela deficiência de qualidade dos serviços de infraestrutura, como, por exemplo a falta generalizada de saneamento ambiental, pela ocupação predatória do meio ambiente em áreas inadequadas, inclusive de risco, pela agressão frontal ao meio ambiente natural e ao meio ambiente construído, pela deslegitimação da autoridade pública fomentando um sentimento globalizado de impunidade –sobretudo nas classes abastadas, como o demonstra episódio há algum tempo ocorrido em Brasília, quando jovens da alta classe média atearam fogo em um índio pataxó que dormia na via pública, e outros tantos em uma doméstica, pensando que fosse uma prostituta, como se isso justificasse procedimento tãocriminoso, tudo determinando em inúmeros centros urbanos o aparecimento de um estado paralelo, penetrado pelo crime organizado, com espantoso poder de fogo, frequentemente impondo-se à comunidade e ao próprio Estado formal. Esse estado paralelo se instala nas favelas, nos cortiços, e nas periferias, tornando cada vez mais problemática a sua dominação e conseqüente extinção, pela infiltração que logra nos segmentos do mundo oficial, sendo muita, vezes impossível distinguir o agente oficial do bandido, tamanha a imbricação entre eles existente.

 

Integram esse crime organizado, de um lado, os traficantes de droga, e, do outro, as milícias, que se substituem aos primeiros, no domínio e opressão das comunidades.

 

No Rio de Janeiro se dá um primeiro passo na tentativa de extinção dessas manifestações da criminalidade, através das Unidades Policiais Pacificadoras, que devem estender-se além das favelas da zona sul, e sobretudo complementar-se com providências destinadas a integrar as comunidades na cidade formal, através de habitações dignas, complexos culturais e esportivos, creches, postos emergenciais de saúde, etc...

 

Até mesmo nos países desenvolvidos problemas análogos existem. Basta ter presente a baixa qualidade de vida no Bronx, um dos cinco bairros de Nova York, ou registrar a presença dos "homeless" em Londres.

 

Há algum tempo, a pretensa maior nação democrática do mundo, os Estados Unidos da América do Norte –cuja hegemonia universal parece em início de declínio  – deram demonstração da profunda tibieza com que tratam as questões urbano- ambientais, quando pecaram pela lenta e inexplicável demora, senão falta de absoluta de assistência à população, sobretudo negra, de New Orleans, tragada e vitimada pelo furacão Katrina.

 

Todos esses fatos acima arrolados tornam evidente a indeclinável necessidade de má política urbanística e ambiental que ordene a utilização e solo urbano, à base da qual se identifique uma renovada democrática concepção da função social da propriedade, e u a consciência mais nítida da função social da Cidade.

 

Por força dessas razões, juntamente com os eminentes colegas professores da Faculdade de Direito, criamos uma Pós graduação stricto sensu, com área de concentração no Direito da Cidade, que entusiasmou os avaliadores da CAPES, programa esse hoje consideravelmente ampliado, que mereceu dos órgãos competentes elevado grau (seis), na recenteavaliação trienal.

 

Esse é um exemplo elucidativo e marcante de uma Universidade, esta UERJ, q e, através de uma de sua unidades, a Faculdade de Direito, opera em estreito contacto com as forças vivas da sociedade.

Outros programas desta Universidade, como, por exemplo o da Terceira Idade, poderiam ser mencionados, mas limitamo-nos ao que acabamos de aludir, porque mais próximo de nós.

 

No que concerne à Universidade como um todo, devemos ter diante de nós a lição, sempre atual, de EDGAR MORIM, que, no século passado, dizia:

"Há inadequação cada vez mais ampla, profunda e grave entre os saberes separados, fragmentados, compartimentados entre disciplinas, e, por outro lado, realidades ou problemas cada vez mais polidisciplinares, transversais, multidimensionais, transnacionais, globais, planetários... Ora, os problemas essenciais nunca são parceláveis, e os problemas globais são cada vez mais essenciais. Além disso, todos os problemas particulares só podem ser posicionados e pensadoscorretamente em seus contextos; e o próprio contexto dessesproblemas deve ser posicionado, cada vez mais, no contexto planetário".

 

Nesse sentido é que a Universidade brasileira precisa compreender toda a extensão do processo civilizatório em que estamos empenhados.

Estamos vivendo uma fase excepcional, em que a extrema pobreza vem diminuindo no Brasil, há um extrato social na base da classe média (a chamada classe C) em ascenção.

 

O crescimento econômico, a geração de empregos formais, a inflação controlada, são alguns fatores impulsionadores dessa melhora.

 

Mas os responsáveis pela governança nesse País, sejam eles quaisquer que venham a ser, precisam ter a consciência de que, embora as políticas assistencialistas ainda por algum tempo devam continuar, o eixo das políticas públicas deve deslocar-se, nos próximos anos, da ênfase do assistencialismo para a efetivação de programas estruturantes.

 

A tônica na educação e na qualificação profissional e o caminho para que se possa avançar mais na redução das desigualdades.

 

Nesse mister a Universidade brasileira tem um destacado papel a desempenhar.

 

E entre as universidades brasileiras, a UERJ deve ter uma posição relevante, por isso que, nos seus breves 60 anos de existência, tem evidenciado uma importância atestada pela qualidade da formação superior que oferece, pelo valor da sua produção científica, pelas centenas de projetos de extensão e desenvolvimento que pratica, e pelos inúmeros serviços prestados à comunidade.

 

Com 31 unidades de graduação, 46 programas de pós graduação stricto senso, 100 programas de pós graduação lato senso em diversas áreas do conhecimento, a UERJ firma-se como uma das principais universidades do País.

 

Por isso, para nós é uma imensa honra ter prestado a esta Universidade, através da Faculdade de Direito, e do nosso desempenho no Conselho Universitário, os modestos serviços que pudemos prestar, conscientes de que há toda uma geração de professores maduros, jovens docentes, há discentes e servidores, preparados para hoje e no futuro, próximo e distante, prosseguir na concretização dos destinos da UERJ.

 

Muito obrigado, Magnífico Reitor Ricardo Vieira Alves, pela emerência que agora recebo, com a sincera modéstia e humildade de sempre.

 

Muito obrigado.

 

Capela Ecumênica, 30 de setembro de 2010

Fonte: Profª. Maria Georgina M. Washington



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