Reproduzimos matérias publicadas no CLIPPING UERJ. Setor privado já domina pós-graduação - Folha de São Paulo da Folha de S.Paulo, no Rio O setor privado, que há muito tempo já era predominante na educação superior, ultrapassou o público em mais um nível de ensino: a pós-graduação. Segundo a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), do IBGE, já havia em 2004 mais estudantes na rede privada do que na pública nesse nível de ensino. Até 2001, o número de matriculados na rede pública era um pouco superior. Tabulações da Pnad feitas pelo pesquisador Simon Schwartzman, ex-presidente do IBGE e presidente do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade, mostram que o setor privado de pós-graduação cresceu 30% de 2001 a 2004, enquanto o público variou 8%. Com isso, a participação privada nas matrículas passou de 49,7% do total para 54,4%. Schwartzman explica que esse crescimento no setor privado se dá, principalmente, por causa dos MBAs e das especializações, que são cursos de pós-graduação lato sensu. Diferentemente dos mestrados e dos doutorados stricto sensu, esses cursos têm carga horária menor e critérios de seleção e aprovação mais flexíveis. Eles também não passam por nenhuma avaliação de qualidade realizada pelo MEC. IBGE x Capes Essa constatação de Schwartzman pode ser confirmada comparando as estatísticas de matrículas do IBGE com as feitas pela Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior). Para o mesmo ano de 2004, o IBGE indicava que havia 304 mil alunos no setor em todo o país. Para a Capes, no entanto, eram apenas 111 mil. Essa diferença de quase 200 mil alunos acontece porque a Capes só contabiliza os estudantes de mestrado e doutorado stricto sensu, ou seja, mestrados e doutorados autorizados e avaliados pelo MEC. No caso do IBGE, como a pergunta é feita em cada domicílio visitado, não há essa restrição e acabam entrando também cursos de especialização e os MBAs. É por essa razão que o domínio do setor privado na pós-graduação só aparece nas estatísticas do IBGE. Pelos dados mais atuais da Capes, para 2005, a participação privada nos cursos stricto sensu era de apenas 17%. O setor privado, no entanto, também cresce mais do que o público nesses cursos, mas num ritmo muito menor do que verificado no IBGE. Em 2001, a participação privada era de 15,6%. Uma das explicações para a preferência do setor privado pelos cursos lato sensu é bastante simples: para abrir um mestrado ou um doutorado stricto sensu, o curso precisa ser aprovado pela Capes e passará por avaliação freqüente que, em caso de má qualidade, pode levar ao fechamento. As regras são, portanto, muito mais rígidas. No caso dos cursos de pós-graduação lato sensu, as instituições têm mais liberdade para abrir e fechar cursos --basta ter credenciamento do MEC para isso-- e não há nenhum tipo de acompanhamento da qualidade ou avaliação oficial deles. Além disso, como os mestrados e doutorados costumam ser bastante voltados para a carreira acadêmica, os MBAs e os cursos de especialização atendem a uma demanda crescente de profissionais que pretendem se aperfeiçoar para continuar ou reingressar no mercado de trabalho. Elitismo Schwartzman também analisou o estudante que chega à pós-graduação. Os resultados mostram um perfil altamente elitista, já que 85% dos matriculados pertencem aos 20% de brasileiros de maior renda familiar per capita. A proporção dos brasileiros que pertencem aos 40% mais pobres e fazem alguma pós é de apenas 1,8%. Esse perfil não varia muito de acordo com a rede onde o aluno está matriculado. No setor privado, a proporção dos 20% mais ricos no total de estudantes é de 87%. Na rede pública, é de 83%. "A expansão da pós-graduação está criando um novo segmento de elite no ensino superior, tanto na rede pública como na particular. Essa tendência de elitização parece ser muito mais forte do que a de abertura para a população de mais baixa renda", analisa Schwartzman. A atriz Elisa Lucinda, que interpreta a Selma na novela global "Páginas da vida", vai reestrear sua peça "Parem de falar mal da rotina", no Sesc do Rio, no próximo dia 4. A novidade é que o espetáculo terá uma cota para negros no auditório do local. Folha Dirigida - Educação/Agenda - pg. 09 - 2/8 Folha Dirigida - Educação - pg. 03 - 2/8 Para quem ainda não recebeu o Cartão de Inscrição (CCI), ainda é possível retirar o documento pela internet. Basta acessar o site www.vestibular.uerj.br e imprimir o cartão. De acordo com a diretora do Departamento de Seleção Acadêmica da Uerj, Elizabeth Murad, os exames de qualificação não cobram matérias do último ano do ensino médio e não exigem decoreba. "Mas é preciso ter informações para conseguir resolver as questões", disse. Elizabeth Murad diz que o exame de qualificação não é uma prova conteudista. "Nosso objetivo é avaliar a capacidade de análise e reflexão dos candidatos. Estas características que eles desenvolvem ao longo de todo o processo educacional e não apenas no último ano. Por isso, não há problema no fato da prova ser aplicada em agosto", explicou a diretora. A diretora lembra, ainda, aos candidatos, que a Uerj não faz pegadinha em suas provas é que é fundamental prestar atenção ao verbo que comanda a questão. "Muitas vezes os candidatos erram por falta de atenção. Não respondem ao que está sendo pedido." Com experiência de quem comanda o vestibular da Uerj há vários anos, para quem vai fazer a prova no domingo, a recomendação é manter a calma. São realizados dois exames na primeira fase. Para cada prova é feita uma inscrição. Os candidatos que desejarem podem realizar as duas provas, sendo que basta a aprovação em um dos exames para garantir o acesso à segunda etapa do concurso. Os candidatos que fazem as duas provas têm considerada a melhor nota para a segunda fase. O exame de qualificação é composto por uma prova de múltipla escolha e dá direito a bonificação, de acordo com o desempenho, para a segunda fase. Para ser aprovado no exame de qualificação é preciso acertar mais de 40% da prova. Mas, quanto melhor o desempenho, maior a bonificação. Os candidatos que acertam mais de 70% da prova são aprovados com conceito A e têm direito a 20 pontos de bônus. Já quem apresenta um percentual de acertos superior a 60% e no máximo de 70% é classificado com conceito B que garante 15 pontos. O conceito C é a nota de quem acerta mais de 50% e no máximo 60% das questões. Estes têm direito a 10 pontos. Já o conceito D é atribuído a quem acerta mais de 40% até 50% da prova. Este conceito dá direito a 5 pontos na próxima fase. Os candidatos que acertam no máximo 40% da prova recebem conceito E e são eliminados do concurso. Somente os aprovados no exame de classificação podem se inscrever para a segunda fase do concurso. Para participar desta etapa é preciso realizar uma nova inscrição. Nesta fase a prova é discursiva. Os candidatos respondem a questões de Língua Portuguesa Instrumental e de disciplinas específicas, de acordo com o grupo de carreiras, e fazem uma redação. A segunda etapa, composta por exames discursivos de disciplinas específicas por grupo de carreira e Língua Portuguesa Instrumental e Redação, vale 80 pontos. A prova está marcada para o dia 10 de dezembro. A candidata do PSS prometeu investir mais recursos na Uerj e para a melhoria salarial dos docentes da instituição Com a disposição da governadora Rosinha Garotinho em não atender as principais reivindicações dos funcionários e da reitoria da Uerj, a esperança da comunidade acadêmica da maior universidade estadual do Rio passa a recair sobre os ombros dos candidatos ao governo que disputarão as eleições de outubro. E, enquanto os integrantes da comunidade tentam arrancar dos políticos garantias de que o volume dos investimentos na instituição será revisto pelo novo governo, e isso inclui um debate com os candidatos marcado para o próximo dia 8, no campus Maracanã, a deputada federal Denise Frossard (PPS-RJ) foi a primeira a se manifestar publicamente a respeito da situação financeira da universidade. "Firmei compromisso com a autonomia financeira e administrativa da Uerj, em contrapartida aos desempenhos de seus indicadores de qualidade. É desafiador, mas precisamos de uma nova escala salarial para premiar, por exemplo, os profissionais do ensino", afirmou a candidata durante a campanha. Como em ano eleitoral muita coisa se promete, é bom que professores, técnicos-administrativos e alunos da Uerj não se empolguem tanto com as palavras da ex-juíza. Mas é inegável que, com estas palavras, pelo menos entre a comunidade da instituição, a candidata já saiu na frente na corrida eleitoral. Representantes de alunos cotistas da Uerj protestaram na semana passada contra o racismo e o preconceito na instituição. O ato foi motivado por uma agressão sofrida pelo aluno do 7º período de Pedagogia, Paulo Henrique da Silva, na última terça-feira, dia 25 de julho, dentro do campus Maracanã. Enquanto discutia com a namorada, aluna do curso de Filosofia, o jovem foi imobilizado pelos seguranças da universidade. De acordo com os manifestantes, a ação dos agentes foi racista e preconceituosa. Segundo Paulo Henrique, sua namorada estava alterada. "Ela disse que tinha me ligado do celular e eu não atendi. Quando peguei o telefone para ver as ligações, dois seguranças me imobilizaram. Me deram tapas, chutes e pontapés", contou o estudante, que ingressou na universidade através das cotas. Moacir Carlos, representante do coletivo de alunos negros da Uerj Denegrir, criticou a administração central. "Não é a primeira vez que alunos negros são vítimas de racismo na Uerj e a reitoria não se manifesta". De acordo com a assessoria de imprensa da universidade, a reitoria ainda não possui uma posição sobre o caso porque ainda avalia o boletim de ocorrência enviado pela coordenação de segurança. A coordenação, por sua vez, não quis comentar o caso, mas disponibilizou uma cópia do documento encaminhado à reitoria. No texto, assinado pelo supervisor Luiz Duarte, foi informado que o funcionário teve sua atenção voltada para um som que parecia ser um tapa e que o rapaz estava apertando a moça de forma agressiva. Ainda de acordo com o documento, foi solicitado que o rapaz largasse a moça, e como o aluno não atendeu, foi conduzido à supervisão, onde o rapaz, totalmente descontrolado, tentou agredir os agentes fisicamente, e acabou agredindo os seguranças com palavras de baixo calão. O Dia - Concursos & Empregos - pg. 18 - 2/8 Os candidatos também podem garantir presença no processo seletivo via Internet, acessando o site www.cepuerj.uerj.br. O valor da bolsa paga aos residentes será de R$ 1.474. A prova objetiva, única etapa da seleção, será aplicada no dia 22 de outubro e terá 100 questões. O resultado final sairá em 21 de novembro. Mais informações: 2587-7707. HAVANA - A internação e o afastamento do poder do líder cubano Fidel Castro abriram a temporada de especulações sobre a sucessão do “comandante” e o futuro do país. Após fazer festa segunda-feira, descendentes e imigrantes cubanos nos EUA já mostravam apreensão ontem devido à falta de informações durante a maior parte do dia, embora o clima de alegria permanecesse. Somente no início da noite Fidel anunciou, por meio de outro comunicado, que teria escrito e que foi lido na TV, que seu estado de saúde é “estável” e que tem “bom ânimo”, mas precisa de “tempo” para se recuperar da cirurgia a que foi submetido depois de uma grave hemorragia intestinal. Antes, o governo de um dos maiores aliados do país, a Venezuela, havia definido a recuperação do cubano como “boa”. Uma das maiores autoridades de Cuba, o chefe da Assembléia, Ricardo Alarcón, foi otimista: “O líder cubano lutará sempre até o último instante. Mas esse último instante está bem longe”. Assim que anunciou sua internação, através de uma proclamação lida por um assessor, Fidel, que completa 80 anos no próximo dia 13, entregou, pela primeira vez, o poder total ao irmão Raul Castro, 75 anos. Foi o suficiente para o governo dos EUA falar que vai “supervisionar” a situação de perto. Há cerca de um mês, os americanos já haviam anunciado um plano de transição para uma eventual ausência de Fidel, que incluiria a liberação de recursos. “O que queremos fazer é continuar garantindo ao povo de Cuba que estamos preparados para ajudar”, disse o porta-voz da Casa Branca, Tony Snow. SEM TRÉGUA O funcionário também afirmou que o governo americano não acredita que Fidel já esteja morto e que não pretende se aproximar de Raúl. “A tentativa de Raúl Castro de se impor sobre o povo cubano é a mesma”, disse Snow. No comunicado de ontem, Fidel não esqueceu dos EUA: “Não posso inventar notícias boas, porque não seria ético. Nesta situação específica de Cuba, devido aos planos do Império, meu estado de saúde se converte em um segredo de Estado”. Governos ao redor do mundo, como os de China, Espanha e Itália, desejaram a recuperação do cubano. Em telegrama enviado a Havana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se dirigiu a Fidel como “presidente e amigo” e também disse que torce pela melhoria da saúde de Castro. Médicos especulam causas Segundo médicos, a idade avançada de Fidel pode ser um agravante de peso em suas complicações de saúde. Na declaração lida pelo chefe-de-gabinete do governo, que teria sido escrita pelo próprio Fidel, a internação foi provocada por “uma crise intestinal aguda com hemorragia sustentada”. O que não faltaram foram especulações sobre a saúde do comandante. “Se os médicos não conseguiram deter a hemorragia sem fazer a cirurgia, e tratando-se de uma pessoa da idade de Castro, o mais provável é que se trate de um divertículo do intestino grosso, pequenas bolsas que se formam na parede do intestino”, explicou o gastroenterologista da Universidade do Sul do Alabama Jorge Herrera. Entre as opções citadas por outros médicos estão úlcera, varicose, isquemia mesentérica e até câncer de estômago ou cólon. Para especialista, regime ainda é forte Segundo o cientista político e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Emir Sader, a morte de Fidel não acabaria com o regime socialista em Cuba. Para Sader, a saída do “comandante” implicaria, a princípio, a manutenção de Raúl Castro no poder, mas, em seguida, poderia envolver outros nomes. “Raúl também está com idade avançada (75 anos) e apareceria como plano imediato. Depois, poderia haver uma combinação de nomes como Carlos Lage (atual vice-presidente), Abel Prieto (ministro da Cultura), Ricardo Alarcón (chefe da Assembléia) e Felipe Roque (chanceler)”, diz, citando nomes atuantes do atual governo cubano. O professor também comentou os planos de transição dos EUA para o fim do governo de Fidel, anunciado há um mês e que voltou à tona depois da internação: “Faz uns dois anos que os EUA aprovaram essa idéia de transição, como se o regime estivesse esgotado. Por trás disso, está uma questão de política interna americana, já que o estado da Flórida tem muitos imigrantes e é um nicho eleitoral importante para Bush”. Até o fim do primeiro semestre, a maioria das escolas municipais e estaduais de São Paulo não cumpria com o tempo mínimo de aulas ao ano, estipulado por lei. Muitos alunos não aprendem nada. Na ONG Florescer, que oferece reforço escolar para 238 crianças do bairro Paraisópolis, na zona sul de São Paulo, todos os alunos estudam em colégios da rede pública e precisam rever conteúdos passados. Alguns dos alunos que buscam ajuda na Ong Florescer também têm aulas de reforço nas escolas públicas onde estudam. Mas essas aulas especiais também parecem insuficientes. Uma estudante denunciada confessou, em depoimento ao procurador, ter pago R$ 800 para obter dois históricos falsos atestando que ela concluiu o ensino fundamental e a primeira e segunda séries do ensino médio em escolas públicas da cidade de Vitória da Conquista, no Sudoeste, do estado. A estudante chegou a cursar um semestre do medicina, mas foi notificada em janeiro deste ano e teve a matrícula cancelada em 30 de dezembro. A Ufba destina 45% das suas vagas para alunos oriundos da rede pública. Deste, 2% vão para descendentes indígenas e 85% dos 43% para aqueles que se declaram negro ou pardo. A atriz Beth Goulart e os escritores Fernando Morais, Frei Betto, Emir Sader, Thiago de Melo e Marília Guimarães estavam no grupo. Uma geração de brasileiros tem sido apagada do futuro pela guerra do tráfico. As cenas do extermínio foram exibidas em março no documentário Falcão, do rapper MV Bill e do produtor de hip-hop Celso Athayde, da Central Única das Favelas (Cufa). Chocou o país pela crueza com que escancarou o massacre. Dos 17 garotos do filme, só um está vivo. Falcão provou que nas favelas brasileiras - e não apenas no Rio de Janeiro - a expectativa de vida dos meninos do tráfico é de 20 anos. São executados antes de se tornar adultos. Maria, Helena, Enilda, Selvina, Josefa, Francisca, Eva e Graça são as pietàs das periferias. As mães vivas de uma geração morta. Um estudo da Unesco, coordenado pelo sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, mostrou que no Brasil a principal causa de morte entre jovens é o tiro. Em 24 anos - de 1979 a 2003 -, a população brasileira cresceu 52%. E os homicídios por armas de fogo aumentaram 543%. O crescimento foi causado pelo assassinato de adolescentes. Das 550 mil mortes ocorridas no período pesquisado, quase a metade atingiu brasileiros entre 15 e 24 anos. Nessa faixa etária, os homicídios cresceram 743%. No restante da população, as estatísticas permaneceram estáveis. A violência matou mais no país que a Guerra do Golfo e os conflitos entre Israel e Palestina. Em 2004, pela primeira vez houve uma queda significativa nas mortes, atribuída pela Unesco ao desarmamento. Mesmo assim, os jovens continuaram na liderança. "São eles que puxam a história da violência homicida no Brasil", diz Waiselfisz. Nesta reportagem, ÉPOCA mostra a guerra brasileira pelo olhar e pela voz das mães dos mortos no tráfico. São dessas mulheres os úteros que ä geram soldados - jamais comandantes - para a narcopátria. O ato de uma mãe enterrar o filho é o avesso da ordem, da natureza e da lógica. A prole dos pobres tomba não por doença ou acidente de trânsito. Mas por tiro, faca, granada. Não como exceção, mas como fato corriqueiro. A morte não tem apenas idade, mas cor e classe social. No estudo Cor e Vitimização por Homicídios no Brasil, os pesquisadores Ignacio Cano, Doriam Borges e Eduardo Ribeiro, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), mostraram que a probabilidade de ser assassinado é quase o dobro para os pardos e perto de três vezes maior para os negros. Na comparação das taxas de homicídios dos moradores dos diferentes bairros das capitais, as estatísticas são mais altas onde a renda é menor e os serviços urbanos mais deficientes. "No Brasil, quem mais morre assassinado são os jovens negros e pobres", diz Cano. "Há uma forte associação entre risco de morte por homicídio, cor e classe social." Se o tráfico de drogas é classificado entre os três comércios mais lucrativos do mundo, o dinheiro não está com as mães nem esteve com seus filhos. A maioria pegou em armas antes de acabar o ensino fundamental. Não deu tempo nem de aprender para que lado fica a Colômbia. Sem poder sair da favela pela ameaça da polícia e de facções rivais, eles gastam a vida em becos imundos, à espera do próximo tiro. São, nas palavras do historiador Marcelo Freixo, da ONG Justiça Global, "garotos pobres atirando em meninos esfarrapados". A seguir, o depoimento de quem os gerou. A mãe mutilada Não há hipérboles na gramática das mães vivas. As palavras são exatas. As frases, sem gordura. Selvina pariu 12 filhos. Perdeu quatro de tiro. Sobre o quinto não tem certeza, porque sumiu. Outros cinco, diz ela, morreram de doença. Restaram dois. Na matemática da miséria, ela afirma não sentir saudade dos filhos que partiram por sarampo ou "quebranto". A dor que a devasta é deixada pelos que se foram de "morte matada". Essa, segundo Selvina, é a morte sem esquecimento. "Entrei no Distrito Federal em 25 de julho de 1959, quando Juscelino Kubitschek era presidente. Vim do Piauí, onde andei de garimpo em garimpo. Vendi um diamante em Copacabana, no Rio de Janeiro, e entrei no Distrito Federal pra progredir na vida", diz. Ela afirma que chegou antes da inauguração de Brasília, mas nunca encontrou lugar. Selvina teve acesso ao Plano Piloto como doméstica. Andou de invasão em invasão até fincar os pés incompletos na Ceilândia. Na cidade-satélite, benze o povo sem saúde. Em troca, não a deixam morrer de fome. Selvina é interrompida pela neta mais velha, órfã da filha assassinada em 25 de março num tiroteio entre traficantes. Tem 17 anos. Está grávida. "Vó, minha bolsa estourou. Preciso ir pro hospital. Estou perdendo sangue." A menina geme. Naquele momento, o pai da criança estava preso por assalto. Pela manhã, não havia o que comer. Selvina se desespera: "Se aquieta, menina, que eu não tenho dinheiro. Vai ter de esperar". Selvina ergue as mãos mutiladas para o céu: "Meu comandante me disse que eu não temesse a ninguém…". Uma faca no útero Mais dois meninos foram assassinados, e o pai acreditou com mais força no pecado original da mulher. Ela continua sua história. "Agora que o último morreu, quero ver quem vai te defender", disse o marido. Grávida do primogênito, ele lhe dava chutes na barriga, bateu com cabo de aço, cortou-lhe a perna. Pisava em cima do pé, a carne abria. Aos 13 anos, o garoto andava com dois revólveres na cintura. "Pai, amo muito o senhor, mas se tocar na mãe de novo eu te mato", disse. E o pai não tocou. "Às vezes penso que foi por isso que morreram. Para não matar o pai e ficar sem salvação com Deus", afirma. "Mas ele era um bom pai. Não batia neles. Só em mim." Essa mãe repete pelo menos três vezes o final das frases. Como se precisasse repetir para acreditar. Avisou também que havia esquecido tudo. "Depois que perdi esses meninos meus, minha cabeça tá tão ruim que não lembro mais de nada, nada, nada", diz. "Pedi muito a Deus para que me tirasse a memória." E então lembra tudo, cada detalhe. O que ela perde, um após outro, desde que o último filho morreu, são os dentes. Eles amolecem e caem. "Pronto. Perdi tudo. Morreu tudo. Tudo, tudo, tudo." Ao iniciar sua narrativa de morte, ela afirma: "Fiquei fria, não choro mais, não sinto mais nada. Nada, nada, nada". Então começa a chorar e não pára mais até o ponto final. A história de sua vida sai encharcada. O próprio Zeus, na mitologia grega, compadeceu-se do pranto de Níobe, cujos sete filhos e sete filhas foram mortos. Zeus, diz a lenda, transformou-a numa rocha que verte água. Foi a forma encontrada pelos antigos para simbolizar a dor sem nome. Mães que perdem filhos assassinados são pedras que choram. Sangue na torneira As crianças perderam os pais. Ela, três filhos. O último em janeiro. Quando o menino de 5 anos dorme, seu olho fica entreaberto, o corpo treme sobre a cama. Ao acordar, tem um olhar vago. Ele todo é um pedido de socorro, precocemente derrotado. Um pedido de socorro sem esperança. A polícia é acusada de ter matado em março três garotos do tráfico no prédio. Um deles, dizem os moradores, caiu na caixa-d'água. Os corpos, segundo eles, foram ensacados, jogados pela escada em caracol e desceram batendo nos degraus. Afirmam que a água saiu das torneiras ensangüentada por um tempo. Graça conta que as balas começaram a abrir buracos nas paredes às 8 horas da manhã. Uma criança, filho da vizinha, espiou pela janela e quase foi atingida. Os tiros cravaram-se no concreto. "A polícia entrou no meu apartamento, a gente já tava no chão. Botou o fuzil na cabeça do meu marido, disseram que iam matá-lo porque a voz dele irritava", afirma. "Engatinhei até meu marido, tapei a boca dele e vim arrastando. As crianças, no chão, se agarravam na minha perna." Graça descreve o país em que vive como dois pedaços partidos. Não há barreira física, visível, entre a favela e o asfalto. Só uma avenida chamada Brasil. Aparentemente, Graça poderia atravessá-la. Mas, se houvesse um muro, ele não poderia ser mais alto. "A gente não tem dinheiro para sair da favela. Estamos presos", diz. "Quem está lá fora não sabe que vivemos em guerra. Pra eles não somos mais seres humanos." O fuzil no portão Ao chegar do trabalho, o filho deixava o fuzil no portão como se fosse a caixa de ferramentas. "Meu filho, não quero esses brinquedos perigosos dentro de casa", ela dizia. "Como bom filho, ele obedecia." Enquanto tirava o almoço, ele tomava banho. Ela lavava e consertava suas roupas, velava o sono. Só quando os fogos pipocavam na favela, avisando da entrada da polícia, Francisca era obrigada a lembrar que a empresa em que o filho trabalhava não era comum. Em março, ele não voltou. "Desde que morreu, tô sem dinheiro pra comprar todos os remédios, a prestação dos óculos venceu. Ficou tudo difícil", diz. Francisca começa a contar como o filho morreu e passa mal. Diz que é o coração. A filha corre, lhe dá remédio. "Quem mora no asfalto tem medo de nós, acha que gente da favela é bicho", diz a garota de 18 anos. Falta o ar a Francisca. Nos becos da favela em que ela e Josefa vivem, há muitos meninos, magrelas ainda, desengonçados, crescendo. Meninos sem pêlos. Bermudas, bonés, pose. Têm fuzis de última geração na mão. Têm mães que num dia próximo vão enterrá-los. Têm filhos que vão substituí-los. Toda a linha de produção do tráfico é visível em apenas 50 metros do beco abarrotado de lixo, de água podre. Os garotos que morreram, os garotos que ainda não morreram, os garotos que ainda vão pegar em fuzis e morrer depois. E as mães que choram. Todos no lado da cidade que abastece o outro lado. Todos no lado da cidade em que se morre de morte matada. Na saída, na fronteira invisível entre os dois mundos, a polícia barra a equipe de reportagem. Tem fuzis AR-15 nas mãos. Apontados para a cabeça de quem sai do carro. Suspeitos por estar do lado de lá - na favela. Por R$ 1 "Fiz tudo o que pude pra salvar meu filho. Quando ele começou a quebrar coisas dentro de casa, todo mundo foi embora, e eu fiquei. Quando tomou uma overdose, eu arrastei ele sozinha do trilho do trem e botei na cama. Quando tava muito doido e enterrou a pistola na frente dos outros meninos, eu fui lá, desenterrei e joguei no quintal do traficante pro meu filho não ter problema depois", diz a mãe. "Deixava comida e suco pra hora que ele tivesse fome e conseguisse comer. Lavei as cuecas que ele sujava quando tava com diarréia por causa da droga. Dei mãozada nele, gritei, internei em clínica. Quando ä vi que não tinha jeito, arrumei um lugar em casa só pra ele usar a pedra sem que ninguém visse, porque não tinha dinheiro pra tirar ele da cadeia." Maria juntou o filho do chão porque ninguém mais teve coragem de desafiar o matador. "Levei ao hospital, porque achei que ia ressuscitar. Fiquei massageando ele. Então vi que tinha dado o derradeiro suspiro", diz. "Se você perde o pai e a mãe, é uma dor muito grande, mas você supera. Se perde um filho, a ferida não sara nunca. Meu filho saiu das minhas entranhas, eu carreguei nove meses, eu amamentei. Eu enterrei." O segundo caixão O bairro da periferia de Fortaleza é dividido em regiões pelo crime. Quem mora de um lado não pode passar para o outro. Se for homem, morre. Se for mulher, leva pedrada, apanha. "Tive de parar de estudar porque a escola fica no outro lado, e eu não podia atravessar", diz a viúva do filho de Enilda. "Agora que ele morreu, voltei." Já passou um ano levando comida para o marido preso, já esteve grávida e abortou quando ele foi assassinado. Tem 17 anos, corpo de menina e um olhar morto. "Sonho, não tenho isso, não", diz. É difícil olhar para ela. No final da tarde, as mães botam os filhos pequenos para dentro de casa. Só voltam a abrir a porta no dia seguinte. Não é fácil ficar trancado dentro de dois cômodos sem janelas num calor tropical. Impedir que os filhos vão à rua é um ato de resistência. Quando chegam à adolescência, de impotência. "A gente controla até os 10, 11 anos. Depois, de um dia pro outro, não consegue mais", diz Enilda. "E o que encontram na rua? Não tem lazer, não tem nada. Tem o tráfico. A pedra tá acabando com os meninos tudinho." Para Enilda, mais insuportável que a morte era a vida do filho. "Eu não agüentava mais assistir meu filho apanhando da polícia. Pedia pra não baterem, mas batiam. Ele já tinha uma hérnia nos testículos de tanto levar chute", afirma. "Em 20 anos de vida, ficou mais tempo preso que solto." Depois de lavar mais de 70 peças de roupa no tanque, engomar e passar para ganhar R$ 25, Enilda se tranca em casa com os filhos pequenos. Assiste a todas as novelas, da primeira à última. A viúva-criança: a próxima geração O filho de Francisca deixou não uma, mas duas viúvas. Dias depois da morte, uma delas rezava para que o atraso na menstruação fosse gravidez. "Será um filho do homem da minha vida e terá seu nome", afirma Cleide, de 26 anos. "Ele sempre disse que eu era a mulher que ia tirá-lo do tráfico. Só não deu tempo." No enterro do filho, no Rio, Francisca pediu à segunda viúva que lhe entregasse o neto para criar. A garota aceitou. O menino, de 1 ano, tem síndrome de Down e complicações cardíacas. Francisca, que não tem dinheiro nem para os próprios remédios, às vezes nem para a comida, ficou feliz. Nem Cleide nem Francisca se assustam com a certeza de criar filhos e netos sem pai. Filho é "riqueza", neto é "bênção". Ambos, acreditam, são assuntos de mulher. Sobre a laje da Brasilândia, em São Paulo, Eva tem seu posto de vigia. "Um dia meu neto pode não voltar pra casa. Ele tem 10 anos, já não gosta da escola. O pai foi assassinado", diz. Aos 55, Eva conta que já esteve encarapitada sobre a boca da favela antes, à espera dos três filhos. E - uma, duas, três vezes - ela esperou em vão. Quando a cabeça do neto aponta no fim da rua, Eva se alegra por ter ganhado um dia. E chora pela cena vazia de amanhã. Em outra periferia do Brasil, outro neto, criado por outra avó, mãe de outro filho assassinado, também espera. "Tô ficando grande, tô ficando grandinho", diz o menino ao voltar da escola. "Meu pai morreu por covardia, o cara que matou ele tem 16 anos. Sinto falta do meu pai. Eu queria ele vivo." O menino tem 7 anos. E quer crescer não para ser bombeiro, médico ou jogador de futebol. Quer crescer para matar outro garoto. Luiz Biondi e Carlos Alberto |
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